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Os Maias são primeiro passo para CNB explorar a riqueza literária clássica

"Nunca foi meu intuito competir com o livro, porque essa obra ganhará sempre", esclareceu Fernando Duarte, defendendo, ao mesmo tempo, que a linguagem da dança consegue transmitir uma emoção e criar conexão com o público sem palavras.

Lusa 13 de outubro de 2025 às 10:13
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O diretor da Companhia Nacional de Bailado (CNB), Fernando Duarte, considera que a peça coreográfica "Os Maias", que se esteia a 16 de outubro, em Lisboa, será o primeiro de futuros projetos para explorar a riqueza literária dos clássicos portugueses. Drama, ação, relação entre personagens, ironia e "uma verdade escondida" fizeram o coreógrafo render-se à vontade e ao desejo de apresentar um bailado inspirado "nessa obra magistral" do escritor Eça de Queirós (1845-1900), explicou, em entrevista à agência Lusa. "Nunca foi meu intuito competir com o livro, porque essa obra ganhará sempre", esclareceu Fernando Duarte, defendendo, ao mesmo tempo, que a linguagem da dança consegue transmitir uma emoção e criar conexão com o público sem palavras. E porquê a escolha de "Os Maias"? "Para mim", disse Fernando Duarte, "seria óbvio escolher esta como a primeira obra que pudesse ser feita pela CNB num bailado narrativo baseado num romance português, porque tem muita atualidade no nosso tempo, pela forma como retrata um modo de viver e um modo de assistir a esse modo de viver". "Eça é um espetador de uma sociedade. Isso tem muito a ver com o bailado, porque nós partilhamos essa dupla posição de atores e espetadores em contínuo", comentou o antigo responsável da Companhia Dança em Diálogos, que fundou em 2018, com a bailarina Solange Melo, adaptando, para a dança "O Primo Basílio" (1878), também de Eça de Queirós, e "O Memorial do Convento", de José Saramago (1922-2010). No Teatro Camões, "Os Maias" terão um total de nove apresentações até dia 26 de outubro. O bailado será apresentado também no Lódz Ballet Festival, na Polónia, no Dia Mundial da Dança, no próximo dia 29 de abril, e em 30 de abril, no Teatro Wielki w Lodzi. O diretor da CNB recordou que a ideia para esta aposta nos clássicos da literatura portuguesa não tem origem recente, e já era pensada há muitos anos, antes de ocupar o atual cargo, quando colaborava como mestre de bailado e coreógrafo para a companhia. "Esta companhia tem de se permitir dar início a uma narrativa com origem nesse repertório clássico do século XVIII e XIX. Ao longo dos tempos, outras companhias, sobretudo na Europa, souberam progredir e encontrar novos modelos de narratividade na dança, ir às lendas e às obras da literatura universal. A CNB, na minha opinião, tardou a entrar nesse caminho, apesar da nossa herança literária tão rica e especial", sustentou. É também desejo do diretor da companhia "que mais propostas e ideias de outros criadores possam partir" da estreia de "Os Maias", com o objetivo de reavivar narrativas como esta, publicada em 1888, sobre três gerações da família, centrando-se na mais recente delas, com o caso amoroso entre Carlos e Maria Eduarda, dois dos personagens que parecem estar à mercê de um destino que os conduz à perdição. "Nós somos inspirados pela magnitude dessa obra, mas só queremos criar um 'altar' secundário para trazer todo este romantismo, realismo e drama de um ponto de vista cru da própria capacidade coreográfica de transmitir uma ação e emoção muito presentes no livro", apontou Fernando Duarte à Lusa. O coreógrafo e bailarino lembrou que essa experiência já tinha acontecido com a recriação de "O Primo Basílio", numa linha de inspiração da obra do escritor do século XIX noutras artes, nomeadamente na pintura, na obra de Paula Rego (1935-2022). "O objetivo também é interagir e reconectar uma sociedade e uma diversidade de gerações com o livro, sejam aqueles que já o leram, e podem querer reler, ou quem nunca leu e tenha curiosidade. É uma forma de colocar uma página adicional de textura e entendimento sobre algo que pode já vir carregado de preconceito, e só pode ser combatido se nos dispusermos a conhecer a obra em profundidade", opinou o diretor da CNB. O espetáculo para escolas, no dia 22 de outubro, "já está esgotado", disse Fernando Duarte à Lusa, e a companhia tem recebido contactos de outros professores interessados para saber de mais oportunidades para os alunos verem a peça, que contará com um elenco de mais de trinta bailarinos. A temporada da CNB "começou com três digressões no norte do país com salas esgotadas, o que revela a importância de estar fora de portas noutros palcos do país", apontou o diretor, acrescentando que a companhia nacional não pertence só ao Teatro Camões - a sua sede em Lisboa -, onde agora irá estrear a nova coreografia. A curadoria musical de "Os Maias" está a cargo de Andrea Lupi, que optou por compositores como o belga César Franck, contemporâneo de Eça, e a austríaca Maria Theresia Von Paradis, que viveu a viragem do século XVIII para o seguinte, estabelecendo uma linha através do tempo da ação. Nos papéis principais estarão, para o personagem Afonso da Maia, os bailarinos Francisco Morais, Mário Franco, Aeden Pittendreigh e Christian Schwarm; em Pedro da Maia serão Francisco Gomes, Frederico Loureiro, Maria Monforte, Inês Ferrer e Filipa de Castro; no papel de Carlos da Maia, Frederico Loureiro, Lourenço Ferreira, Diogo Bettencourt e João Costa, e, no papel de Maria Eduarda da Maia, estarão as bailarinas Raquel Fidalgo e Patrícia Main. Além da programação artística prevista, a CNB irá apresentar uma programação paralela, através do Programa de Aproximação à Dança, com ateliês e conversas pré e pós espetáculo, com artistas, especialistas e público.
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