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Chuck Palahniuk: "O cinema fez do Fight Club uma obra-prima"

Um dos livros de culto do início do milénio celebra os seus 20 anos com uma sequela comic e uma reedição em Portugal. Nós celebrámos falando com o autor

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Chuck Palahniuk: 'O cinema fez do Fight Club uma obra-prima'
Markus Almeida 17 de agosto de 2016 às 18:48

Para chegar à conversa com o escritor foi preciso ultrapassar um momento de desconforto. É que ao pedido de entrevista enviado ao seu agente literário nos Estados Unidos seguiu-se a resposta: "Olá, Chuck. Por favor diz-me como queres que trate disto." Ignorar e esperar que ele se apercebesse do erro? Ou dizer ao agente que em vez de fazer forward a Palahniuk respondera ao jornalista? Escolheu-se esta opção, juntando-lhe um remate empático: "Olhe, acontece-me a toda a hora." Do outro lado, silêncio. Passados três dias, silêncio. Um novo email e ainda silêncio. Dois dias depois surgia na caixa de correio uma entrada com o título "Palahniuk aqui". Era o próprio, de um email cujo endereço começava (para os fãs este será um pormenor delicioso) por Tyler. A data e hora da conversa ficaram acertadas em meia dúzia de emails. Clube de Combate, no original Fight Club, uma crítica à sociedade contemporânea, capitalista e consumista, foi pela primeira vez publicado a 17 de Agosto de 1996 com a chancela da W. W. Norton & Company (em Maio, a Marcador lançou uma nova edição). Com 34 anos, Chuck cumpria o objectivo de ser publicado por uma das principais editoras independentes dos Estados Unidos. Em Maio, a Marcador lançou uma nova edição, com tradução do jornalista e escritor Hugo Gonçalves Já o tinha tentado antes, com Monstros Invisíveis (viria a ser publicado em 1999), sobre uma modelo desfigurada num acidente de viação. "As pessoas pareciam gostar, mas ninguém quis arriscar e publicá-lo", contou-nos ao telefone a partir de Portland, Oregon, Estados Unidos. Antes disso, Palahniuk, que trabalhou numa linha de montagem de camiões depois de se formar em Jornalismo pela Universidade de Oregon, só tinha escrito contos: "Estava a escrever uma colecção de contos e pensei que fossem todos diferentes, mas quanto mais os escrevia mais me apercebia de que eram sempre sobre as mesmas três pessoas. E percebi que todos poderiam estar interligados e transformar-se num romance. Foi assim que surgiu Clube de Combate." Os contos foram a forma que Palahniuk encontrou para "aprender a escrever" e são também o seu formato preferido. "Gosto de contos porque me permitem escrever com uma intensidade em termos de voz ou linguagem que deixaria o leitor esgotado de cansaço caso a história continuasse por 200 páginas." Um combate a sério O sucesso do livro não foi imediato - aconteceu três anos mais tarde a reboque do filme que David Fincher realizou e Brad Pitt, Edward Norton e Helena Bonham Carter protagonizaram - aliás, também esta adaptação se tornou uma obra de culto que deixou marca na cultura pop da viragem do milénio. "O David Fincher pegou no meu livro e criou uma obra-prima. Também há partes no filme do Clark Gregg [que em 2008 realizou Choke - Asfixia, a partir do livro homónimo de Palahniuk, sobre um homem que finge engasgar-se em restaurantes para receber a atenção e carinho de estranhos] que acho maravilhosas e de partir o coração." Lullaby será o próximo livro a chegar ao cinema. Uma campanha de crowdfunding no Kickstarter já terminou com €368.772 angariados (o objectivo era €227.531). "Foi na verdade opção do realizador e da produtora fazer uma campanha de crowdfunding. Eu concordei em co-escrever o guião", confessa à SÁBADO. "Nos livros que foram adaptados (Choke - Asfixia e Clube de Combate) limitei-me a ficar sentado e a ver. Neste concordei ajudar a escrever o guião e é provável que acompanhe parte da rodagem." A sequela, finalmente a sequela Em Maio de 2015 chegou às livrarias, sob a forma de novela gráfica com a chancela da reputada editora de banda desenhada Dark Horse Comics, o primeiro fascículo da sequela de Clube de Combate, Fight Club 2 - os grafismos ficaram a cargo dos artistas David Mack e Cameron Stewart. Com 10 capítulos, Fight Club 2 foi sendo publicado mensalmente até Março e em Junho todos os números foram reunidos num livro.A história desenrola-se 10 anos depois da original, em que um homem com insónias desenvolve uma segunda personalidade - Tyler Durden - com quem inicia um clube de combate clandestino, uma organização para derrubar a América capitalista e ainda um estranho triângulo amoroso com a enigmática Marla. Agora, o narrador - de quem finalmente conhecemos o nome: Sebastian - tem um emprego aborrecido, é casado com Marla, vive nos subúrbios e tem um filho. De Tyler Durden nem sinal - até ao dia em que Marla, entediada com a vida suburbana, troca por placebos os medicamentos que mantêm Tyler longe da mente de Sebastian. Entre Clube de Combate, em 1996, e Fight Club 2, em 2016, Palahniuk publicou mais 15 livros, nenhum dos quais contendo vinhetas ou desenhos a acompanhar o texto. O que fez, então, com que Palahniuk quisesse escrever a sequela da sua obra mais popular num formato e com uma linguagem e códigos próprios e que lhe eram estranhos? "A minha editora tinha andado a enviar-me à Comic Con. Um dia, uma amiga que conhece pessoas ligadas aos comics em Portland organizou um jantar e convidou-os a todos - entre eles estava o Brian Michael Bendis, que é uma das pessoas mais importantes nos comics - e todos me pareceram muito simpáticos e ofereceram-se para me ajudarem a aprender a escrever comics." A aprendizagem consistiu em "reduzir os diálogos a um mínimo", a "incluir acção" e a ter um "sentido visual em cada parte da história". É muito diferente de escrever um conto ou um romance, conta, "mas não é mais difícil". A maior dificuldade foi aprender a fazer com que a cada duas páginas o leitor encontrasse algo surpreendente - ele chama a isso "a page turn reveal". Não é fácil: "Num livro que tem 24 páginas é preciso ter 12 ou 13 cenários preparados para compensar o leitor quando muda a página."Chuck Palahniuk, para quem "responder aos emails é uma forma de relaxamento", parece estar sempre a trabalhar. Conversou com a SÁBADO no fim de Junho em vésperas de começar uma intensa digressão promocional de Fight Club 2 pelos Estados Unidos, e estava completamente envolvido num novo projecto. Bait, um livro de colorir para adultos, com saída marcada para Outubro. "Conheço muitas pessoas que gostam de colorir livros, então pensei: 'Porque não uma colecção de pequenos contos em que as ilustrações fossem feitas por alguns dos melhores ilustradores do mundo, como os que participaram em Fight Club 2?' Escrevi oito histórias adultas e ofensivas e encontrei-me com oito ilustradores. É um livro muito bonito, como um livro de contos, com imagens bonitas para os leitores colorirem, só que algumas das histórias... são um pouco perturbadoras."

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