De narrativas a factos: os relatórios que desmontam mitos
A análise dos relatórios oficiais, alicerçada em factos e não em perceções, demonstra que o desempenho do Ministério Público continua a pautar‑se por exigência técnica, rigor e eficácia, mesmo perante constrangimentos evidentes de recursos.
Vejamos o último relatório síntese da atividade do Ministério Público divulgado, relativo ao ano de 2024, o qual, uma vez mais, fornece dados objetivos que contrariam, em múltiplas dimensões, aquilo que tantas vezes é apresentado no espaço público como uma realidade indiscutível.
De acordo com os dados oficiais mais recentes, em 2024 foram instaurados mais inquéritos do que em 2023 (um aumento de 33,4%), mantendo-se a tendência de subida do volume global de processos movimentados, sem que a este aumento corresponda um reforço proporcional dos recursos humanos afetos ao Ministério Público, nem dos meios materiais colocados ao serviço da investigação e da ação penal.
Os inquéritos findos voltam a representar uma parte maioritária dos inquéritos movimentados no ano, mantendo-se uma taxa de resolução significativa, apesar do acréscimo de complexidade e da especialização crescente da criminalidade investigada.
Regista-se, entre outros indicadores, um aumento expressivo do número de inquéritos relativos a crimes de branqueamento de capitais (2.899 em 2024, face a 1.734 em 2023), crimes ambientais (671 em 2024 e 521 em 2023) e crimes praticados contra pessoas com deficiência (422 em 2024, comparativamente a 255 em 2023). Entre os fenómenos criminais que mais cresceram em 2024, em relação ao ano anterior, destacam-se ainda a criminalidade económico-financeira, com um aumento de 69,6%, e os furtos, roubos e recetação de metais não preciosos, que registaram uma subida de 77,6%.
No plano das decisões finais, constata-se que o Ministério Público mantém uma posição central na condução da ação penal, assegurando percentagens muito significativas de exercício dessa função, sobretudo nos domínios de criminalidade mais grave e complexa. Esta realidade evidencia uma intervenção particularmente robusta em processos da competência de tribunal coletivo e tribunal singular, bem como em processos abreviados e nas diversas formas especiais de processo, abrangendo de modo consistente a criminalidade económico-financeira e organizada.
Atendendo ao número de despachos de pronúncia e de suspensão provisória do processo proferidos em 2024, verifica-se que as decisões proferidas em inquérito pelo Ministério Público, relativamente às quais foi requerida a abertura de instrução, vieram a ser confirmadas judicialmente em 72% dos casos em que foi proferida decisão instrutória de mérito. Este dado traduz um elevado grau de validação judicial das opções processuais assumidas em fase de inquérito, refletindo, em termos qualitativos, a solidez da avaliação probatória efetuada pelo Ministério Público.
No que respeita à fase de julgamento, observa-se que as decisões de acusação são confirmadas, em todas as formas processuais, com taxas particularmente elevadas: 80,7% no tribunal singular, 86% no tribunal coletivo, 92% no processo abreviado, 97,8% no processo sumário e 99,5% no processo sumaríssimo. Estes resultados revelam um padrão de forte correspondência entre a acusação deduzida e a decisão final dos tribunais, sugerindo, em perspetiva global, um elevado grau de consistência técnica e de eficácia na atuação do Ministério Público em juízo.
Importa igualmente destacar a vertente patrimonial da atuação do Ministério Público: em 2024 o valor global de bens e valores apreendidos ou arrestados, bem como o volume de vantagens patrimoniais cuja perda a favor do Estado foi requerida, mantém-se muito elevado, refletindo uma aposta clara na recuperação do produto do crime e na neutralização das vantagens económicas da atividade criminosa. Foram declarados perdidos a favor do Estado 19.779.217,79 euros.
Regista-se também um decréscimo na interceção de comunicações (8.935 em 2024, face a 10.563 em 2023), com uma redução de 15,41% face ao ano anterior, dado que contraria perceções e merece análise à luz das opções processuais, da evolução tecnológica e das necessidades da investigação criminal.
Os dados do Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) e do Relatório Síntese do Ministério Público relativos a 2024 impõem uma reflexão séria e informada sobre as necessidades de reforço de meios humanos e materiais dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público, sob pena de se comprometer a capacidade de resposta às novas formas de criminalidade e às exigências de eficiência e qualidade da justiça penal.
A análise dos relatórios oficiais, alicerçada em factos e não em perceções, demonstra que o desempenho do Ministério Público continua a pautar-se por exigência técnica, rigor e eficácia, mesmo perante constrangimentos evidentes de recursos (persistente escassez de magistrados, polícias e oficiais de justiça; insuficiência e desatualização das infraestruturas e dos sistemas de informação). Estes indicadores confirmam a solidez da intervenção na defesa da legalidade democrática e no combate à criminalidade mais complexa, reiterando a importância de que o debate público sobre a justiça se funde em dados concretos e não em narrativas distorcidas.
À medida que se encerra o ano de 2025, impõe-se reconhecer o trabalho persistente de todos os que servem a justiça com empenho e sentido de missão.
Que esta época festiva seja um tempo de serenidade, partilha e esperança renovada na construção de um sistema de justiça mais sólido e eficaz.
Feliz Natal e um Ano Novo de confiança e determinação!
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