Secções
Entrar
Miguel Costa Matos Economista e deputado do PS
11.03.2025

O país não está melhor

Mais do que um erro pessoal, esta estratégia de Montenegro tem o defeito de consolidar a dúvida como uma ferida aberta na confiança dos portugueses nos políticos.

Luís Montenegro recusa-se a dar mais esclarecimentos, deixando várias perguntas importantes sem resposta. O Partido Socialista viu-se obrigado a recorrer ao único mecanismo parlamentar para obrigar o Primeiro-Ministro a responder: uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Montenegro quer evitá-la tanto que até prefere ir para eleições antecipadas, apenas um ano depois de ser eleito e no meio de uma situação internacional terrível. Fá-lo apresentando uma moção de confiança, mesmo depois da rejeição de duas moções de censura e sabendo de antemão que esta moção será chumbada pelo PS, posição que o PS anunciou na própria noite eleitoral. Estamos, por isso, perante uma escolha consciente de Montenegro: eleições em vez de esclarecimentos. 

Será incontornável para o país discutir o triste caso em que Montenegro se deixou enredar. Como afirma o politólogo António Costa Pinto, "é muito difícil explicar como é que um político experiente comete este erro". A semana passada referi a primeira regra de gestão de crises comunicacionais: "tell it early, tell it all, tell it yourself". Montenegro fez ao contrário, chegando ao ponto de esconder o nome profissional da advogada Inês Varajão Borges que colabora com a sua empresa. Mais do que um erro pessoal, esta estratégia de Montenegro tem o defeito de consolidar a dúvida como uma ferida aberta na confiança dos portugueses nos políticos. 

As eleições serão, porém, seguramente sobre muito mais do que isso. Este não é um referendo às irregularidades e imoralidades de Montenegro mas, sim, a escolha de um Parlamento e, consequentemente, de um Governo que possa dar ao país melhores condições de estabilidade política, desenvolvimento económico e justiça social. No passado sábado, Luís Montenegro lamentou "não [ver] ninguém dizer é que este país está hoje melhor do que estava há um ano". Se o Primeiro-Ministro meter a mão na consciência, se calhar é porque não está. 

Não está melhor em termos económicos. Sem contar com o ano de 2020, por causa da Covid,o crescimento desacelerou, atingindo o pior ano desde 2015 (1,9%) e o investimento para o pior ano desde 2014 (2,3%). Também o crescimento dos salários desacelerou, não obstante a conclusão de acordos com vários setores da função pública. O Governo distribuiu o excedente que herdou mas, com isso, condenou-nos a um travão brusco da despesa pública em 2027 e 2028, talvez sabendo que não duraria tanto tempo. Não obstante, o investimento público ficou 1400 milhões de euros aquém do previsto em outubro. 

Não está melhor em termos sociais. Mais de 300 mil alunos estiveram sem aulas a pelo menos uma disciplina durante pelo menos três semanas, com o Governo a revelar-se absolutamente incapaz de atenuar esta crise. Tanto no verão como no Natal, houve mais urgências fechadas do que no ano anterior e há também mais portugueses sem médico de família do que no ano anterior. Já os preços da habitação estão a subir a um ritmo mais acelerado do que no ano anterior. O Governo não ajuda, desregulando o alojamento local e deixando os jovens 6 meses à espera de resposta no programa de apoio ao arrendamento Porta 65.  

Para lá destas áreas o país também está pior. O atraso na execução do PRR está-se a agravar. Houve cortes de 700 milhões na ação climática e atrasos na Lei de Bases do Clima e nos compromissos em matéria de biodiversidade. O Primeiro-Ministro falta a cimeiras internacionais por não se conseguir ligar ao Zoom ou, pior, para jogar golfe com o dono da Solverde. Por fim, porque escrutinar tudo isto deve ser muito chato, o Governo evita responder às perguntas da comunicação social. 

O mais impressionante é como é que, em tão pouco tempo, o Governo conseguiu cometer tantos erros. Certamente não terão feito só erros e, seguramente, algumas delas terão continuidade num futuro Governo PS. Todavia, no meio dos erros do caso Spinumviva, importa não esquecer todos os outros. Interrompidos por um golpe sobre absolutamente nada, os portugueses têm nos Socialistas mãos seguras para o país crescer mais, investir mais e servir melhor os portugueses. 

Mais crónicas do autor
16 de setembro de 2025 às 07:12

A magia de como cortar o IRC

Em 2022, um artigo científico comparou 441 estimativas de 42 diferentes estudos. A sua conclusão foi de que não podem rejeitar a hipótese de uma descida de IRC não ter impacto no crescimento. Isto quer dizer que, mesmo depois de 441 estimativas, não podemos ter a certeza que exista.

09 de setembro de 2025 às 07:41

O que é bom não é novo, o que é novo não é bom

A redução do número de estudantes a entrar para o ensino superior é, por isso, uma tragédia que importa solucionar.

02 de setembro de 2025 às 07:18

Quando falta gente, o Estado falta

Por todo o Estado, há sinais de escassez gritante de pessoal. Faltam dois mil guardas prisionais. Já na carreira de enfermaria faltam 20 mil profissionais. A isto poderíamos somar a falta de médicos no SNS.

26 de agosto de 2025 às 07:38

Floresta: o estado de negação

Governo perdeu tempo a inventar uma alternativa à situação de calamidade, prevista na Lei de Bases da Proteção Civil. Nos apoios à agricultura, impôs um limite de 10 mil euros que, não só é escasso, como é inferior ao que anteriores Governos PS aprovaram. Veremos como é feita a estabilização de solos.

29 de julho de 2025 às 07:12

Manifesto por um novo patriotismo

Estou farto que passem por patriotas aqueles que desfazem e desprezam tudo o que fizemos, tudo o que alcançámos e, sobretudo, tudo o que de nos livrámos – a miséria, a ignorância, o colonialismo.

Mostrar mais crónicas
Descubra as
Edições do Dia
Publicamos para si, em três periodos distintos do dia, o melhor da atualidade nacional e internacional. Os artigos das Edições do Dia estão ordenados cronologicamente aqui , para que não perca nada do melhor que a SÁBADO prepara para si. Pode também navegar nas edições anteriores, do dia ou da semana.
Boas leituras!