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Lara de Sousa Dantas
11.01.2025

IRS Jovem: Um alívio temporário ou uma solução por metade?

O que os jovens precisam não é apenas de uma folga temporária no IRS. Precisam de condições que lhes permitam sonhar, investir e prosperar. Precisam de um mercado de trabalho que valorize o talento e o esforço. Precisam de salários justos.

O IRS Jovem é, na teoria, uma ideia promissora. Uma espécie de luz ao fundo do túnel para quem está a começar a navegar as águas turbulentas do mercado de trabalho em Portugal. Durante três anos, permite beneficiar de uma isenção parcial no IRS: 30% no primeiro ano, 20% no segundo e 10% no terceiro, desde que os rendimentos anuais não ultrapassem os €7.500. Para jovens entre os 18 e os 26 anos, ou até 30 no caso de doutoramento, este alívio fiscal apresenta-se como um gesto de apoio numa fase marcada por incertezas e desafios. Mas, entre a promessa e a realidade, há um desfasamento que é difícil ignorar.

Quando ouvi falar pela primeira vez no IRS Jovem, confesso que fiquei dividida. Por um lado, é positivo perceber que alguém se lembrou de quem está a dar os primeiros passos no mercado de trabalho. Por outro, é inevitável pensar se esta medida é realmente o que precisamos. Por mais bem-intencionada que seja, parece insuficiente para fazer frente aos problemas profundos que afetam os jovens em Portugal.

Comecemos pelo limite de rendimentos. A ideia de isentar uma parte do IRS é útil, especialmente para quem ganha perto do salário mínimo. Mas, para quem ganha um pouco mais — digamos, €1.200, um valor que, sejamos realistas, continua a ser apertado em muitas regiões do país —, o impacto desta isenção torna-se quase irrelevante. E quando consideramos os custos de vida em cidades como Lisboa e Porto, onde as rendas são proibitivas e os transportes públicos nem sempre são uma solução acessível, o IRS Jovem sabe a pouco. É como tentar apagar um incêndio com um copo de água.

Depois há o limite de idade. Entendo que a medida seja pensada para apoiar os primeiros anos de trabalho, mas nem todos seguem o mesmo percurso. Há quem termine os estudos mais tarde, quem enfrente períodos de desemprego ou quem passe anos em trabalhos precários antes de conseguir um contrato digno. Colocar um limite aos 26 anos — ou 30 no caso de doutoramento — é fechar os olhos à realidade de muitos jovens cujas trajetórias não cabem nestas molduras. A vida nem sempre segue o cronograma idealizado pelo legislador.

Mesmo assim, não nego que a medida tenha mérito. É um reconhecimento, ainda que modesto, de que os jovens precisam de apoio numa fase crítica das suas vidas. Poupar parte do imposto nos primeiros anos de trabalho pode ajudar a pagar uma conta ou aliviar um pouco o peso mensal. Mas não podemos confundir este gesto com uma solução. Porque não é. Não resolve os baixos salários. Não resolve os custos absurdos da habitação. Não resolve a precariedade laboral que ainda domina tantos setores em Portugal. E muito menos resolve o sentimento de que estamos a construir vidas num país que tantas vezes parece empurrar-nos para fora.

O IRS Jovem é, no fundo, um pequeno passo. Um sinal de que há vontade de apoiar quem está a começar. Mas, por si só, não é suficiente. O que os jovens precisam não é apenas de uma folga temporária no IRS. Precisam de condições que lhes permitam sonhar, investir e prosperar. Precisam de um mercado de trabalho que valorize o talento e o esforço. Precisam de salários justos, de habitação acessível e de políticas que olhem para eles como um pilar essencial do futuro do país, e não como um fardo temporário.

A verdade é que o IRS Jovem é um gesto que aponta na direção certa, mas não chega. E enquanto medidas como esta não forem acompanhadas por reformas estruturais, será difícil que muitos jovens vejam em Portugal um lugar onde podem realmente construir as suas vidas. É um alívio bem-vindo, claro. Mas o que precisamos, mais do que alívios, é de soluções que nos deem razões para acreditar.

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