Um projeto sério, difícil, mas possível, e muito recompensador. É assim que a direção da Belcinto vê o projeto “Leather Goods by Belcinto”, com o qual ganhou o Prémio Europeu de Sustentabilidade para PME, SME EnterPRIZE, lançado em Portugal pela Tranquilidade | Grupo Generali. Esta primeira edição foi dedicada às PME com as melhores práticas em sustentabilidade ambiental.
O projeto “Leather Goods by Belcinto” está a acabar com o desperdício de matérias-primas numa empresa que sempre teve uma grande preocupação com a sustentabilidade, o que a tornou pioneira neste tema, no setor dos artigos em pele. Como explica Ana Maria Vasconcelos, em nome da direção da empresa, “o objetivo do projeto é, a partir dos excedentes de matéria-prima das coleções e produtos que fazemos para clientes, fabricar produtos nossos, que reutilizam a totalidade desse material. São peças únicas, no conceito de desperdício zero.”
Durabilidade sem desperdício
Para alcançar esse ideal de acabar com o desperdício de matéria-prima, as equipas da Belcinto têm de pensar no design das peças de forma rigorosa, para realizar todo o potencial dos materiais, garantir a funcionalidade das peças, e satisfazer (e surpreender) os clientes. Isto dentro de um ideal de sustentabilidade e durabilidade que sempre orientou esta empresa familiar, desde que foi fundada em 1961. “Transformamos o desperdício em produtos que são nossos. É o caso do saco ‘Charlie’, um modelo que já fazemos há muitos anos.
"O objetivo do projeto é (...) fabricar produtos nossos, que reutilizam a totalidade desse material"
Ana Maria Vasconcelos, diretora-geral da Belcinto
São objetos únicos, com produção quase peça a peça, contrariando a produção em massa, trazendo mais sustentabilidade à moda”, afirma Ana Maria Vasconcelos.
De grande importância para a capacidade de a Belcinto produzir esta linha própria, baseada no seu conhecimento e na sua história, foi a adoção de metodologias “lean” de produção, com uma preocupação permanente com o desperdício, não só de matérias-primas, como de tempo, energia e outros recursos. Nesta lógica, refere Ana Maria Vasconcelos, a empresa foi acrescentando produtos à sua gama “de forma a haver circularidade nas matérias-primas”. “Quando introduzíamos um produto, introduzíamos outros produtos em função da matéria-prima desperdiçada por esse produto, de forma a não existir desperdício. Isto sempre com muita criatividade, de maneira a consumirmos os excedentes de matéria-prima. Como a moda traz consumo, ao fim destes anos, já temos uma variadíssima gama de produtos desenvolvidos internamente”. O que ajuda à sustentabilidade económica da empresa, mais independente das modas.
Metodologia “lean” abre mercados
A aplicação desta metodologia permite à Belcinto trabalhar mais com marcas novas, que estão a começar no mercado internacional. “Educamos estas novas marcas na escolha dos produtos e dos materiais. Por exemplo, não trabalhamos com sintéticos. Procuramos que utilizem produtos que temos em stock, que lancem produtos com mais variedade e menos quantidade, mas mais duráveis, numa lógica contrária ao fast fashion”. Mas a metodologia “lean” não permite apenas trabalhar com pequenas marcas. “Esta metodologia, que também é utilizada por algumas marcas de luxo, permite ganhar rentabilidade em produtos com muita mão de obra, com um valor acrescentado muito grande, que podem demorar cinco ou seis horas a produzir”, refere.
Na verdade, e para além de a Belcinto ser pioneira na certificação ambiental da produção no seu setor, a questão da sustentabilidade sempre esteve muito presente na empresa, desde a forma como trata os colaboradores até ao orgulho na durabilidade dos seus produtos. Para a direção, a empresa sempre teve propósitos muito claros: “Sempre pensámos no futuro. Sempre demos garantia ilimitada nos produtos. Sempre reparámos os nossos produtos, sem custos. Ainda hoje recebemos pedidos de reparação de peças com a nossa marca, objetos com 30 ou 40 anos. O nosso slogan faz 30 anos e é ‘fazemos produtos com alma’. Por isso, consideramos que os nossos produtos são eminentemente sustentáveis.” São peças feitas, desde sempre, com alma, para durar vidas. E agora, cada vez mais, sem desperdícios.
Moda amiga do ambiente
Desde que foi fundada em 1961, a Belcinto pensa no futuro. Quer no fabrico de artigos feitos para durar vidas, quer na liderança na certificação ambiental no setor.
A Belcinto é uma empresa familiar de São João da Madeira, que junta duas famílias e que sempre esteve no negócio da moda no fabrico de artigos em pele. Inicialmente, produzia cintos, mas diversificou rapidamente, primeiro para as malas e sacos de viagem, e depois para todo o tipo de artigos em pele. Focada no mercado nacional, que chegou a liderar, a Belcinto foi entrando no mercado internacional nos últimos 30 anos.
Com a crise de 2008, a empresa virou-se totalmente para a exportação, com o mercado internacional a representar atualmente 98% da sua faturação. A empresa sempre se posicionou na gama média-alta e tem já uma presença no mercado do luxo. Trabalha essencialmente a “private label”, mas vende com marca própria em alguns mercados, como o Japão, com um posicionamento de sustentabilidade.
"Este ano, já reduzimos em quase 40% o consumo de energia"
Primeira empresa a ter certificação ambiental
Para Ana Maria Vasconcelos, diretora-geral da empresa, a candidatura ao prémio SME EnterPRIZE surgiu de forma natural. A Belcinto foi a primeira empresa do seu setor a ter uma certificação ambiental. Para esse efeito fez um trabalho rigoroso de medição da pegada ambiental e das emissões. Tem vindo a trabalhar sempre na redução do consumo de energia e de água, e na redução de resíduos e desperdício. “Este ano, em que isso é particularmente importante, já reduzimos em quase 40% o consumo de energia”, refere. A empresa interveio igualmente na alteração do processo produtivo e investiu na substituição de materiais por outros mais ecológicos, com projetos em desenvolvimento na área da bioeconomia. Uma intervenção que nunca parou, nem nos anos da pandemia. “Um caminho sem retorno”, afirma a responsável.
"Somos uma empresa que é mais valorizada lá fora do que cá dentro"
A Belcinto orgulha-se sobretudo de fazer um trabalho consistente na sustentabilidade, que vai muito além da questão ambiental. “Já praticamos a sustentabilidade há muito tempo nos vetores das pessoas, produtos e ambiente. Desde que estamos mais no mercado internacional, o que mudou é que tivemos de sistematizar mais a informação.” Na sua perspetiva, a sustentabilidade ambiental hoje em dia é um dado adquirido, uma exigência de negócio. “Nos eventos a que vou, falamos antes de ‘empresas com propósito’, o que é uma perspetiva mais alargada”, refere.
Sustentabilidade é caminho sem retorno
A atribuição do prémio SME EnterPRIZE é importante, segundo a direção, para que, internamente, os colaboradores valorizem o trabalho feito e se empenhem no caminho da sustentabilidade. Para a responsável da empresa, o retorno é emocional. “Somos uma empresa que é mais valorizada lá fora do que cá dentro, porque estamos de facto na liderança em muitos aspetos, junto da concorrência internacional. Por isso, este reconhecimento nacional é muito bem-vindo”. Para as outras PME que pretendam seguir o caminho da sustentabilidade ambiental, Ana Maria Vasconcelos sublinha que “a sustentabilidade é o único caminho”. “É importante pôr em prática. Fazer uma estratégia para a sustentabilidade, mas ir por pequenos passos, com metas curtas e objetivos viáveis.”
Empresa: Vasconcelos e Companhia, Belcinto
Projeto: Leather Goods by Belcinto
Nascida: 1961, sediada em São João da Madeira
94 colaboradores
4,9 milhões de euros de faturação
98% da produção para exportação
PME aderiram a Prémio Tranquilidade
Na primeira edição desta iniciativa da Tranquilidade/Grupo Generali foram muitas as PME, de todo o país, que se candidataram com projetos de sustentabilidade ambiental em diferentes vertentes: modelo de negócio, produtos e serviços, inovação e transformação digital. Os projetos foram apreciados por um júri altamente qualificado com o apoio da consultora EY. Os distinguidos, no dia 28 de setembro, foram:
Vencedor:
Vasconcelos e Companhia, com o projeto “Leather Goods by Belcinto”.
Menções Honrosas:
– Promecel – Indústria de Componentes Mecânicos e Elétricos, com o projeto “PPS – Promecel Purpose with Sustainability”;
– ALGAplus – Produção e Comercialização de Algas e seus Derivados, com um projeto que irá representar Portugal na final europeia deste prémio.
Finalistas:
– Adega Cooperativa de Borba, com o projeto “Práticas sustentáveis, da vinha à garrafa”;
– Extruplás, Reciclagem, Recuperação e Fabrico de Produtos Plásticos, com o projeto “Ecorail”;
– Floating Particle, Investigação e Desenvolvimento, com dois projetos: o “SiTAPE – Smart Water Grid Technology” e o “Stella – Tecnologia de Hidrogénio”;
– For Teams, Advertising e Merchandising, com o Projeto Loop;
– Vitropor, Sociedade Portuguesa de Vidro Temperado, com o projeto “Preservar o futuro”.
Assim se cumpriu a primeira etapa de uma iniciativa que visa dar visibilidade às melhores PME e inspirar e incentivar cada vez mais empresas a ser sustentáveis.