Já dizia Confúcio: "Aquilo que escuto eu esqueço; aquilo que vejo eu lembro; aquilo que faço eu aprendo." A ideia não podia vir mais a propósito de um tema que merece (ainda) pouca atenção da parte de alguns pais, mas que tem vindo a revelar-se fulcral a cada dia que passa: a importância da saúde oral nos mais jovens!
Mariana Seabra, especialista em odontopediatria na Medical Art Center, no Porto, lembra que, no caso dos mais jovens, "não basta dizer, importa fazer e repetir muitas vezes para garantir uma eficaz aprendizagem".
Algo tão ou mais importante quando, segundo o Global Oral Health Status Report, 2022, "mais de um terço da população mundial vive com cárie dentária não tratada". Números que acabam por se transformar num "grande problema de saúde pública para as populações e governos de todo o mundo", defende Mariana Seabra.
Saúde oral é um direito
A médica especialista lembra que a saúde oral é um direito do ser humano "que se deve preservar por toda a vida", sendo que "a cultura da prevenção é a grande vantagem da medicina dentária moderna". Para isso é necessário tomar decisões acertadas de forma a salvaguardá-la até porque "quando uma pessoa não goza de saúde oral não está de perfeita saúde".
Ou seja, o melhor que se pode fazer é prevenir, pois "o adiamento do tratamento serve apenas para aumentar a dificuldade na sua execução", sendo que problemas como "a cárie dentária, doenças periodontais e outras condições orais, se não forem tratadas, podem levar à dor, infeção e perda de função mastigatória". Uma realidade que, no caso dos mais jovens, "afeta negativamente a aprendizagem, a comunicação, a nutrição e outras atividades necessárias para o crescimento e desenvolvimento normais".
E esta não é uma realidade assim tão distante de todos nós. A especialista lembra que "algumas crianças que procuram atendimento pela primeira vez na Clínica têm já cáries graves na primeira infância". Mariana Seabra vai mais longe e revela que uma criança é prejudicada e corre riscos de sofrer perturbações psicológicas devido à falta de cuidados de saúde oral.
Os pais e cuidadores devem, por isso, ter conhecimento e consciência da necessidade de cuidados preventivos adequados. Apesar de, reconhece, ser certo que "a falha em procurar ou obter atendimento adequado pode resultar de fatores como isolamento familiar, falta de apoio financeiro, dificuldade de transporte, pouca literacia familiar ou falta de valor percebido de saúde oral".
Pouca perceção da realidade
Atualmente, a forma como os pais encaram a saúde oral dos filhos é ainda variável: "A maioria dos pais classifica a saúde oral das crianças como sendo boa, dizendo que efetuam a sua higiene oral todos os dias." Mas será que isso chega? Claramente não, até porque muitas vezes temos crianças com várias cáries e os pais consideram que "todos os hábitos alimentares e de higiene oral estão a ser cumpridos."
Para Mariana Seabra "a forma como os pais olham para a sua própria saúde oral reflete-se na saúde oral das crianças". E acrescenta que "as cáries em dentes de leite são muitas vezes desvalorizadas pelos pais" e continuam a sê-lo também "por profissionais de saúde".
Então, o que deve ser feito para alterar uma realidade que começa a preocupar especialistas por todo o mundo? A médica fala na necessidade de "consciencializar a população mais jovem para a urgência de implementar cuidados de forma que um dia sejam adultos com uma dentição saudável". Para ajudar a conseguir este objetivo, pais e cuidadores devem assegurar a correta higienização oral, enquanto as crianças "não são capazes de o fazer".
Por outro lado, "é importante que os responsáveis adotem uma atitude positiva na higiene oral e na forma como esta deve ser executada bem como com os hábitos alimentares".
Mediante os grupos etários (bebé, criança, adolescente) existem momentos mais fáceis e outros mais difíceis: "Eu sei que é difícil resistir aos pedidos permanentes de doces, nomeadamente gomas, chupas e chocolates, mas é importante tentar educar as crianças e adolescentes a comer doces sim, mas com controlo no horário, quantidade e frequência". Diz Mariana Seabra que "doces à noite ou ao longo do dia em vários horários é um disparate" já que o doce deve ser ingerido "após a refeição", mas apenas quando existe a hipótese de escovar os dentes.
O adiamento do tratamento serve apenas para aumentar a dificuldade na sua execução Mariana Seabra, especialista em odontopediatria na Medicar Art Center
A partir de que idade se deve consultar um especialista?
A primeira visita ao dentista deverá ocorrer por volta dos 12 meses, segundo recomendações internacionais. Trata-se de um primeiro passo, importante, "para ajudar a prevenir o número de bebés e crianças que sofrem de cárie dentária", diz Mariana Seabra. Fazer uma consulta preventiva dá a oportunidade de "examinar a boca do bebé, mas mais importante do que isso permite aconselhar, ensinar e discutir práticas alimentares, dentição, hábitos, rotinas". A partir daí, as visitas devem ser feitas de forma periódica.
Vou ao dentista…e agora?
A visita ao dentista pode gerar receios por parte das crianças e jovens. Por isso, a grande questão passa por perceber como aproximar as crianças do seu médico dentista. Mariana Seabra sabe que "há muitas histórias associadas aos dentistas que os pais precisam de desmistificar". Assim sendo, a visita a um consultório dentário deve ser encarada com total naturalidade, sendo um dos passos importantes para a criança compreender que "ir ao dentista não é difícil, nem doloroso e nem traumático, ao contrário de muitas histórias que se ouvem". Quando acompanhamos as crianças desde muito cedo, com uma profilaxia adequada, estas irão ter um percurso de vida, a nível de saúde oral, muito mais natural e atraumático".