Esta iniciativa tem como objetivo disponibilizar alojamento e pequeno-almoço, de forma
gratuita, às famílias de crianças carenciadas que se desloquem da sua zona de residência para consultas médicas, tratamento hospitalar ou internamento. Tornando aquele espaço num prolongamento das suas casas.
Das dificuldades da vida surgem muitas vezes grandes ideias. E foi uma experiência traumática que inspirou a CEO do grupo NEYA Hotels, quando há cerca de 30 anos teve de internar a filha no hospital, que na altura tinha apenas dois meses e meio.
"A minha filha ainda mamava, portanto, tinha uma sensação terrível quando não podia pernoitar no hospital e tinha de a deixar, sentia que estava a abandonar a minha bebé. Foi um momento negativo, uma experiência traumática, mas a partir da qual tentei construir algo positivo em prol de outros pais e da comunidade", diz Yasmin Bhudarally, CEO da NEYA Hotels.
Yasmin Bhudarally, CEO da NEYA Hotels
A NEYA Hotels acredita que, ao ajudar os familiares, está também a ajudar estas crianças, oferecendo-lhes a proteção e a segurança de terem a família perto numa altura de maior fragilidade. Até ao momento, o NEYA Lisboa Hotel alojou 100 famílias e cuidadores, num total de 600 noites.
Como surgiu a ideia do projeto Quarto Solidário?
Surgiu através de uma experiência um pouco traumática na minha vida pessoal. Há aproximadamente 30 anos, a minha filha bebé, com apenas dois meses e meio de vida, teve internamento urgente no Hospital Dona Estefânia. Tinha sido mãe pela primeira vez e, num momento em que qualquer mãe deseja que seja pacífico, vivi uma grande instabilidade psicológica, emocional e familiar.
A minha filha ainda mamava, portanto, tinha uma sensação terrível quando não podia pernoitar no hospital e tinha de a deixar, sentia que estava a abandonar a minha bebé. Foi um momento negativo, uma experiência traumática, mas a partir da qual tentei construir algo positivo em prol de outros pais e da comunidade.
Quando é que este projeto teve início?
Passados uns anos, adquiri o imóvel em frente ao Hospital Dona Estefânia que se tornou a primeira unidade hoteleira do nosso grupo. A partir daí, de cada vez que olhava para o outro lado da rua retornava aquele momento da minha vida e pensei: "Este hotel não pode ser mais um hotel, tem de ser um hotel que tenha um propósito, que faça a diferença." Reconheci de imediato que muitos pais estariam de certeza a passar pela mesma experiência. Este foi o ADN do Quarto Solidário, projeto que arrancou em 2012.
Este projeto de responsabilidade social corporativa oferece alojamento e pequeno-almoço gratuito aos pais ou cuidadores de crianças internadas ou em tratamento
A responsabilidade social faz parte dos valores do grupo NEYA?
Para o nosso projeto hoteleiro um dos pilares é a responsabilidade social. É uma missão que já está intrínseca no grupo e nos colaboradores. Podemos disponibilizar a nossa unidade, a nossa estrutura e os nossos recursos humanos para ajudar a comunidade. "Sê a mudança que queres ver no mundo" é uma frase de Gandhi que me tem acompanhado ao longo da vida.
Temos a possibilidade de fazer a diferença na vida das pessoas, por mais pequena que seja. Almejamos diariamente ser mais do que um grupo de hotéis, de edifícios que vendem quartos e refeições.
Como é que este programa funciona? Quem ajuda e como?
Este projeto de responsabilidade social corporativa oferece alojamento e pequeno-almoço gratuito aos pais ou cuidadores de crianças internadas ou em tratamento no Dona Estefânia ou em outros hospitais do Centro Hospitalar de Lisboa, a maternidade Alfredo da Costa, o Hospital de Santa Marta, o Hospital Santo António dos Capuchos, o Hospital de São José e o Hospital Curry Cabral. Para uma criança estar bem, precisa do apoio dos seus pais, da sua família, dos seus cuidadores. Eles têm de estar próximos da criança. Este é um direito que entendemos que as crianças devem ter.
As famílias são identificadas pela ação social dos hospitais, que faz a triagem. Essa equipa seleciona pais ou cuidadores que têm os filhos internados em Lisboa ou Porto e que moram longe, seja no Algarve, nos Açores, por exemplo. Pessoas que não têm possibilidade de regressar a casa e que não têm possibilidades económicas. Feita a seleção, a ação social envia-nos um pedido de acolhimento no hotel.
Como é a estadia?
Facultamos as mesmas condições que facultamos a qualquer cliente. A família fica hospedada no nosso hotel e é recebida e acolhida por um embaixador da nossa marca. É disponibilizado um quarto e pequeno-almoço e é um programa que funciona durante o ano inteiro. Mesmo durante a pandemia da covid-19, muitos pais, devido à limitação de circulação dos concelhos, não tinham onde ficar. Por isso, mesmo o hotel estando fechado, tivemos famílias que lá ficaram quarenta e cinco dias. Entreguei a chave, disse "está aqui". Posso dizer que foi um momento muito importante na vida do hotel e creio que na vida dos pais.
Almejamos diariamente ser mais do que um grupo de hotéis, de edifícios que vendem quartos e refeições
Acabam por criar uma ligação especial com os pais?
Estamos presentes num momento da vida destes pais, em que se encontram muito fragilizados e deprimidos. O nosso staff é formado para os acompanhar, por exemplo, ao pequeno-almoço, para que percebam que estamos lá para eles. Seja para conversar ou estarmos juntos em silêncio. Assim, muitas vezes, quando vêm do hospital, depois das consultas, acabam por falar com essa pessoa que os acompanhou. Mantém-se essa ligação. Ainda hoje temos pais que nos visitam.
Quais são os parceiros deste projeto?
Os nossos parceiros são o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, do qual faz parte o Hospital D. Estefânia, e a Fundação Infantil Ronald McDonald. Mais recentemente também assinámos um protocolo de colaboração com o Centro Materno-Infantil do Norte, no Porto.
Tem ideia, ao longo destes anos todos, de quantas famílias já foram apoiadas?
Contabilizamos mais de 100 famílias e cuidadores apoiados com o nosso projeto num total de 600 noites de alojamento. Apesar de os números serem importantes, as histórias e as emoções que estas pessoas nos deixam e partilham, as lições de vida aqui ficam, são o que mais gosto de recordar.
É uma iniciativa para continuar para o futuro?
Sem dúvida, o projeto nasceu no hotel em Lisboa e já foi está a ser implementado no NEYA Porto Hotel, que é a nossa mais recente unidade. Percebemos cada vez mais que os projetos têm de ter um propósito e este é o nosso propósito.