A história da aldeia que é um dos lugares mais sagrados para os católicos chineses, fruto de uma aparição de Nossa Senhora, em 1900, para proteger os locais de uma rebelião nacionalista
No interior do norte da China, uma igreja do tamanho de um quarteirão, com paredes e colunas brancas, ergue-se no centro de uma aldeia, entre casas de tijolo cru, estradas poeirentas e plantações de melancia.
Trata-se da aldeia de Donglu, um dos lugares mais sagrados para os católicos chineses, fruto de uma aparição de Nossa Senhora, em 1900, para proteger os locais de uma rebelião nacionalista.
Aqui, a 140 quilómetros a sudoeste de Pequim, capital de um país governado por ateus e sem relações diplomáticas com o Vaticano, quase todos os habitantes são católicos.
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"Desde crianças que recebemos os ensinamentos de Deus", diz à agência Lusa Ke Hua, uma local de 27 anos, que está a ajudar a irmã, proprietária de uma loja de artigos religiosos.
"A fé dá-nos restrições morais e uma base enquanto seres humanos", explica.
O cristianismo, na China, estará mesmo numa fase de grande expansão, preenchendo "o vazio moral" e o "excessivo materialismo" provocados pela alegada crise da ideologia comunista e o trepidante desenvolvimento das últimas três décadas de "Reforma Económica e Abertura ao Exterior".
Ke reconhece a existência de uma "crise de valores" e lamenta que "os interesses económicos estejam hoje por detrás de tudo".
"Até as crianças já pensam em dinheiro; as ligações entre as pessoas deixaram ter como base os afetos", diz.
Pequim não tem relações diplomáticas com a Santa Sé e a base teórica marxista do Partido Comunista Chinês, que governa o país desde 1949, promove o ateísmo.
Em Donglu, contudo, o catolicismo tem uma história antiga e obteve maior proporção com as aparições de Maria em 1900, que o Vaticano confirmou em 1928.
No domingo de páscoa, a igreja da aldeia está a abarrotar. Nas ruas, lançam-se petardos e fogo-de-artifício para "afugentar os maus espíritos", uma tradição reservada na China para a passagem do Ano Novo Lunar, a mais importante festa para os chineses.
Entre os crentes, trocam-se ovos com a inscrição "Deus ama-te" e, em frente à igreja, vende-se algodão doce, outra novidade no país.
"No meu coração, sou livre de ter fé", afirma Rui Yi, nascida e criada em Donglu. "Não me importa as restrições que nos colocam. Isso não abala a minha crença em Deus", atira.
Estima-se que haja já 12 milhões de católicos no país, entre os quais muitos optam por celebrar a sua fé em igrejas clandestinas, que juram lealdade a Roma, arriscando represálias das autoridades.
À chegada, o padre avisou os jornalistas da Lusa de que corriam o risco de ser detidos, mas a reportagem acabou por decorrer sem incidentes.
Não foi sempre assim: em abril e maio de 1996, um ano após uma segunda alegada aparição de Maria, mais de cinco mil efetivos militares, 30 carros blindados e diversos helicópteros foram destacados para Donglu.
Fontes católicas dizem que as peregrinações a Donglu foram proibidas na década de 1990, com a polícia a selar a estrada da aldeia.
A aparição de Nossa Senhora terá ocorrido durante a revolta dos Boxers, movimento nacionalista contra a presença estrangeira na China, que tornou comum os atentados e torturas contra comerciantes, missionários e diplomatas estrangeiros.
Donglu já era então uma aldeia predominantemente católica e, quando os atacantes chegaram, Maria terá vindo em socorro dos crentes.
Tal como as aparições de Fátima em 1917, a igreja católica confirmou a veracidade das aparições de Donglu. Em 1932, o Papa Pio XI consagrava a aldeia como um lugar de culto a Nossa Senhora da China.
Hoje, para os habitantes de Donglu, a maioria empregados no fabrico de gruas manuais ou no cultivo de melancia, a fé parece ser uma forma de fugir à dureza da vida na aldeia.
"Acreditar em Deus é amar a humanidade, amar todas as pessoas, sem limites", descreve Rui Yi. "Porque amo Deus, não conheço o ódio".
Por João Pimenta, da agência Lusa
Donglu, a aldeia católica num país governado por ateus
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