Uma Cerveja no Inferno @Model.HTag>
No século XIX, esta valorização da singularidade fez do desvio um valor paradigmático. Muitos escritores identificavam-se com os marginais e defendiam tudo o que provocasse horror à burguesia.
No século XIX, esta valorização da singularidade fez do desvio um valor paradigmático. Muitos escritores identificavam-se com os marginais e defendiam tudo o que provocasse horror à burguesia.
Hemingway confessa que já não conseguia enfrentar um touro, excepto quando tomava três ou quatro cálices de absinto, porque “me inflamavam a coragem e me distorciam os reflexos”.
O génio é um ser à parte, infeliz e incapaz de lidar com o quotidiano estrangulador, cujo destino sobre a Terra é sofrer e viver numa solidão terrorífica, vítima expiatória de uma sociedade materialista.
Com Condorcet nascia o mártir da Revolução, que incluiria outros escritores, entre os quais Pierre François Lacenaire, que para melhor dar a conhecer os seus poemas decidiu passar pela guilhotina, onde foi executado com apenas 32 anos.
Escolhendo viver à margem dos pactos mundanos e das honrarias, recusando colocar a sua pluma ao serviço dos poderosos, e sofrendo por isso todos os males, Rousseau tornou-se o grande mártir (ou santo laico) da segunda metade do século XVIII.
A celebridade e o prestígio popular que alguns pensadores, artistas, escritores e cientistas adquiriram pela monstruosa perseguição de que eram alvo, e pela coragem demonstrada face à corte e aos grandes, tornaram imensamente atractiva a ostentação pública do sofrimento e da desgraça.
Desconcerta ver agora Miguel Sousa Tavares a queixar-se da intolerância alheia e, rodeando-se de mel e borboletas, intitular-se pacifista, quase um monge budista. Porque a verdade é que não consegue suportar a frustração e as contrariedades. As críticas irritam-no.
A SÁBADO instituiu-se como uma ameaça permanente aos corruptos e a todos os que se dedicam ao compadrio, à gatunagem e ao nepotismo, impedindo-os de viverem na santa paz das suas mentiras e intenções ocultas.
BSS e MST são personalidades acima das criaturas vulgares, que destoam da mentalidade à sua volta e sobressaem no deserto de ideias em que nos encontramos. Pertencem à casta dos grandes intelectuais desobedientes e incómodos.
Convencido de que foi escolhido para salvar o país das ameaças estrangeiras e lhe devolver a grandeza perdida, Putin estabeleceu como verdade histórica indiscutível a ideia de que a Rússia foi o principal obreiro da vitória de 1945.
Há também um quadro emocional ou afectivo que explica esta melancolia soviética (e que talvez contrarie a ideia de que Putin é – ou sempre foi – um monstro frio e empedernido), mas associado ao mar Negro e à Ucrânia.
Não nos equivoquemos. A influência e o poder dos oligarcas russos não se limitam a Inglaterra nem é um problema exclusivo do capitalismo inglês. É um fenómeno mundial que envolve todo o sistema financeiro internacional.
A esquerda portuguesa fala do nazismo dos ucranianos com todos os pormenores e considerações, mas cala-se a respeito das ligações entre Putin e as figuras representativas do fascismo europeu como Le Pen (França), Salvini (Itália), Wilders (Países Baixos), Orbán (Hungria), bem como de populistas de extrema-direita como Trump e Bolsonaro.
Para esta esquerda, a Rússia limita-se a reagir às acções do Ocidente. Uma tese que encaixa como uma luva na retórica de Putin: cercada pela NATO, provocada pela sua estratégia agressiva e imperialista, a Rússia não teve outra alternativa senão lançar uma guerra total contra um país independente.
Em Putin, como em todos os déspotas, tudo se resume a uma única ideia: “Minto descaradamente, mas, como sou o mais forte, vocês têm de acreditar em mim”.
Desde que se tornou Presidente, em 2000, Putin cultivou sempre a imagem de macho dominador e dominante, alguém que é dono de si próprio, um líder forte, duro e viril, uma máquina de combate ou um super-herói cuja missão é proteger a pátria e devolver-lhe a grandeza perdida.