Como é sobreviver a uma overdose

Setenta e quatro pessoas morreram vítimas de overdose por consumo excessivo de drogas ilegais em 2021. Desde 2009 que o número não era tão alto, revela o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD). A SÁBADO entrevistou cinco sobreviventes de overdoses que estão a recuperar em centros terapêuticos.
Por Susana Lúcio

Setenta e quatro pessoas morreram vítimas de overdose por consumo excessivo de drogas ilegais em 2021. Desde 2009 que o número não era tão alto, revela o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD). A SÁBADO entrevistou cinco sobreviventes de overdoses que estão a recuperar em centros terapêuticos.

Por Susana Lúcio
Luís Basílio
45 anos, Olhão

"Tinha 20 anos quando tive a minha primeira overdose. Estava em Huelva, Espanha, para comprar cocaína. O traficante mostrou-me o produto, parecia escama de peixe e quis experimentar. ‘Isso é demais, dá para três pessoas!’, avisou-me o traficante. Eu disse-lhe que estava habituado e fui injetar-me para a casa de banho. Assim que entrou na veia, ouvi um zumbido, comecei a suar e saí para a rua. Suava tanto que a chuva que caía parecia não tocar na pele. Caí para o lado e acordei numa clínica veterinária. Estava lá um médico que me deu um antagonista para reverter o efeito da cocaína. Depois voltei à casa do traficante e comprei a cocaína. Era material puro, da Colômbia. Eu era um rebelde. Aos 14 anos fumava charros e pedi a dois primos que me batizassem na heroína. Eles recusaram sempre, mas um dia piquei o braço com um alfinete e fingi que estava a ressacar. Um deles acreditou. Gostei: ando sempre a mil e aquilo acalmou-me. Os meus pais tentaram ajudar-me, mas aos 16 soube que era seropositivo. O médico deu-me seis meses de vida. Então decidi gozar a vida e dar na heroína até ao fim. A segunda overdose foi na cadeia. Tinha 27 anos e aguardava julgamento por furtos e roubos. Tomava metadona e enganaram-se a ler a dose indicada pela médica e, em vez de 20 mg, deram-me 200 mg. Tive blackouts, estava tão fraco que tinham de me dar a comida à boca. Mas os guardas achavam que era fita. Fui para a cela descansar, injetei heroína e apaguei. Acordei no hospital. Em 2020, vim para a Associação Sol Nascente e saí no início de 2022. Aguentei três meses. Voltei à cocaína e perdi 50 kg. Regressei à associação em novembro. É a última vez que vou tentar."
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