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Operação Marquês

José Sócrates e a suspeita do consumo de cocaína

28.10.2019 12:59 por António José Vilela 30
Durante a fase de investigação da Operação Marquês, o Ministério Público suspeitou que o antigo primeiro-ministro também usava o dinheiro, detido pelo seu amigo Carlos Santos Silva, para comprar droga. Sócrates vai prestar novas declarações esta segunda feira.
  • 19215
 Durante estes quatro anos não ouvi por parte da direcção do PS uma palavra de condenação destes abusos, mas sou agora forçado a ouvir o que não posso deixar de interpretar como uma espécie de acusação sem julgamento  Considero, por isso, ter chegado o momento de pôr fim a este embaraço mútuo. Enderecei hoje uma carta ao Partido Socialista pedindo a minha desfiliação do Partido.  A escolha que fiz de Manuel Pinho como porta-voz do PS para a área da economia, e mais tarde para o Governo, aconteceu naturalmente na decorrência da colaboração que este há muito prestava, na condição de independente, ao PS, como conselheiro económico do então líder Ferro Rodrigues. Foi aí, nessa condição de membro do chamado grupo económico da Lapa (…), que o conheci e que desenvolvemos um trabalho comum que viria a culminar no convite que lhe fiz

O antigo primeiro-ministro José Sócrates regressa, esta segunda-feira, ao banco dos arguidos para prestar declarações no processo Operação Marquês, desta vez perante o juiz Ivo Rosa. No passado, Sócrates já falou duas vezes: quando foi detido, em novembro de 2014, com o juiz Carlos Alexandre; e depois só perante o procurador Rosário Teixeira e o inspetor tributário Paulo Silva, a 27 de Maio de 2015 e a 13 de março de 2017 - dois interrogatórios explosivos. 

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Durante a fase de investigação do processo, o procurador Rosário Teixeira e o inspector tributário Paulo Silva suspeitaram que Sócrates também usaria o dinheiro, formalmente na posse de Carlos Santos Silva, para comprar cocaína, tendo confrontado directamente Célia Tavares, namorada de Sócrates, com o facto. Recorde a investigação da SÁBADO sobre esta matéria:

É uma história polémica que começou durante a fase mais sigilosa da Operação Marquês e cujo desenlace final ainda hoje é um mistério. Poucos meses antes de os investigadores judiciais avançarem para a detenção de José Sócrates, a 21 de Novembro de 2014, o procurador Jorge Rosário Teixeira, o inspector tributário Paulo Silva e o juiz de instrução Carlos Alexandre ouviram várias gravações de escutas telefónicas e ficaram a suspeitar que o antigo governante usava o dinheiro na posse do alegado testa de ferro Carlos Santos Silva para comprar ou mandar comprar cocaína e/ou outros estupefacientes.

Segundo esta teoria inicial dos investigadores, a alegada compra de drogas poderia ser mais uma das muitas despesas pessoais e suspeitas de Sócrates, tal como também se verificaria com o pagamento de viagens, alojamentos em hotéis de luxo, refeições, livros, roupas, quadros, imóveis e até gastos tidos com familiares, amigos e namoradas. Somado, tudo isto podia atingir alguns milhões de euros, sendo que os procuradores e o juiz de instrução do caso nunca acreditaram na versão de que o dinheiro provinha de empréstimos obtidos por Sócrates. Para o Ministério Público (MP), Santos Silva sempre foi o "agente fiduciário", um dos testas de ferro que Sócrates usaria para branquear e dissimular os seus próprios milhões de euros que estavam inicialmente guardados em contas na Suíça e que teriam resultado de pagamentos por actos de corrupção cometidos quando foi primeiro-ministro de Portugal.

Como o enfoque principal da Operação Marquês ficou desde logo centrado nesta investigação pormenorizada da origem e do destino final do dinheiro que circulara durante vários anos de Santos Silva para Sócrates, a suspeita do consumo de cocaína foi vista não como um crime autónomo (desde Novembro de 2001 que a aquisição, a posse e o consumo de drogas deixou de ser considerado crime em Portugal, sendo apenas objecto de contra-ordenação), mas sim como mais um possível gasto pessoal que tinha de ser investigado. E foi isso que sucedeu.

Depois de analisar durante várias semanas dezenas de documentos da Operação Marquês, a SÁBADO apurou que o MP tentou deslindar esta suspeita associada às drogas, tendo assumido isso no processo no momento em que também tomou a decisão de fazer buscas, no início de 2015, às casas de Sócrates e da mãe, Maria Adelaide Monteiro. Precisamente quando também quebrou o sigilo bancário e fiscal de António José Pinto de Sousa, o irmão de Sócrates que morreu em Agosto de 2011 e cujas despesas associadas à assistência hospitalar e ao funeral (cerca de 37 mil euros) foram pagas por Santos Silva.

Sob intensa contestação jurídica e até social por manter Sócrates detido há pouco mais de 70 dias, a maioria deles na prisão de Évora, o procurador Rosário Teixeira aproveitou o que prometia ser mais uma mediática operação de buscas para mandar também notificar discretamente duas mulheres divorciadas, Célia Tavares e Lígia Correia, que mantinham há anos relações muito próximas ou mesmo íntimas com o ex-primeiro-ministro socialista. As duas foram inquiridas no mesmo dia, uma de manhã e a outra à tarde: a 5 de Fevereiro de 2015.

Célia Tavares
Célia Tavares
Célia Tavares

As conversas de Célia com Sócrates sobre vinho
A primeira a testemunhar foi a (ex) namorada de Sócrates, Célia Tavares, uma estudante de um curso nocturno de Direito que tinha completado 55 anos há apenas seis dias e que estava desempregada há vários anos depois de trabalhar em diversos hotéis e restaurantes e, mais recentemente, na Loja das Meias, que ainda hoje existe na Rua Castilho, em Lisboa, perto da rua onde residia Sócrates.

O depoimento gravado no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) começou às 10h10 e durou cerca de 1h30. Na sala, estavam os procuradores Rosário Teixeira, Ana Catalão (que quase não falou), o inspector Paulo Silva e a funcionária judicial Cristina Gonçalves. Apesar de se encontrar com graves dificuldades financeiras – Célia chegou a lamentar-se de estar a receber apenas um cheque mensal de 178 euros de apoio do Estado devido à falta de meios para sobreviver –, a testemunha apresentou-se no DCIAP acompanhada pelo advogado João Basílio, um ex-realizador de televisão que se tornou mestre em Direito. No entanto, o defensor manteve-se quase sempre em silêncio durante a agitada sessão, mesmo quando as perguntas dos investigadores se tornaram extremamente contundentes sobre o conteúdo de várias escutas telefónicas de conversas, verificadas poucos meses antes, entre Sócrates e Célia Tavares.

A primeira questão dos investigadores centrou-se na data em que a testemunha conhecera o antigo governante. Mas rapidamente as perguntas chegaram à relação íntima entre Célia e Sócrates e aos contactos que a mulher tinha tido com outros intervenientes secundários, como Rita Gomes, a empregada doméstica angolana que trabalhava há anos para o ex-líder do PS e a mãe, Maria Adelaide. Neste último caso, Célia disse que sim, que conhecia Rita, mas especificou que tinha estado com ela apenas uma vez e que tal sucedera quando a empregada fora ter com ela à faculdade para lhe levar, em Maio de 2014, mais "uma ajuda" (dinheiro) do patrão.

O inspector Paulo Silva (PS) ouviu a resposta e pareceu perguntar o que já sabia: "Levar a ajuda? Era ajuda ou era alguma coisa que era preciso entregar em troca?"
Célia Tavares (CT): "Não, era ajuda. Como assim, alguma coisa que tem que se entregar em troca?"
PS: "O sr. eng.o tinha-lhe pedido ‘umas garrafas de vinho’. Entregou? Tem alguma especialidade na área dos vinhos?"

Às aparentemente inusitadas questões do inspector, Célia respondeu "não", mas Paulo Silva não deixou cair as razões que julgava estarem subjacentes ao encontro com Rita. Só que a testemunha reiterou que se tinha limitado a receber o dinheiro de Sócrates (o montante nunca foi citado na inquirição) e que não havia entregado nada em troca. O inspector disse-lhe que não acreditava naquela resposta e voltou a dar a entender que conhecia bem o conteúdo dos contactos telefónicos entre Célia e Sócrates. "Umas garrafas de vinho que entretanto foram colocadas num envelope e entregues à D.Rita (…) e a Rita empregada entregou o envelope que vinha do sr. eng.o. A troca foi esta", disse, peremptório, Paulo Silva.

Na altura, os investigadores duvidavam bastante de que teria existido uma simples entrega de dinheiro a te de Sócrates a Célia Tavares. As razões da desconfiança assentavam em dois tipos de informações oficiais que constavam já na Operação Marquês: o conteúdo de conversas gravadas a 14 de Maio de 2014 entre Célia e o ex-primeiro-ministro e também outras intercepções telefónicas registadas dois dias antes do referido encontro na Cidade Universitária, em Lisboa. Intercepções em que surgia a real entrega periódica de dinheiro a Célia Tavares.

Neste último caso, a informação tinha sido incluída num longo relatório da Autoridade Tributária sobre uma parte das alegadas passagens suspeitas de dinheiro para Sócrates, um documento datado de 15 de Janeiro de 2015 em que Paulo Silva registou o dia 12 de Maio de 2014 como a "25.a entrega" com origem em Santos Silva. Nestes registos, assentes sobretudo num conjunto de escutas resumidas e transcritas, não ficou mencionado o montante em causa, mas apenas as conversas telefónicas gravadas, os intervenientes e o percurso que teria sido feito pelo dinheiro. Nesse dia, e segundo o mesmo relatório, aconteceu isto: no início da tarde, Sócrates telefonou a Santos Silva a pedir algo que tratou por "aquilo" e o "mesmo número de documentos". A entrega ficou combinada para Telheiras (próximo da então residência de Santos Silva), com o amigo empresário a telefonar depois à mulher, Inês do Rosário, para ser ela a fazer a entrega – na conversa trataram a questão como "fotocópias".

Recorde o interrogatório de março de 2017 a José Sócrates: 


Cerca de 45 minutos depois do telefonema inicial entre Santos Silva e Sócrates, o motorista João Perna avisou o empresário por SMS que se encontrava já em Telheiras. Horas depois e ainda nesse dia, por volta das 20h, Perna telefonou também a Célia, tendo combinado que iria ter com ela à faculdade para lhe entregar a "ajuda" de Sócrates. Às 20h56, Sócrates recebeu uma SMS da mulher dizendo que estava finalmente aliviada e muito agradecida. No fim, a mensagem terminava assim: "Um beijo muito grande. Tenho-te no meu coração todos os segundos da minha vida."

Testemunha nega ter sido comprada cocaína
Logo depois de Sócrates ter sido detido, soube-se publicamente que o MP tinha anotado no processo que o alvo principal solicitara inúmeras vezes "fotocópias", "folhas", "dossiers", "aquela coisa", "alguma coisa", "daquilo", "daquela coisa que gosto muito" e que o empresário amigo fizera-lhe depois chegar, inclusive através do motorista João Perna, enormes quantias em notas. Os montantes individuais entregues foram muito variáveis, mas raramente se situaram abaixo dos 5 mil euros. E, em alguns casos, poderão ter chegado aos 50 mil. Estas entregas de dinheiro eram feitas após o uso das alegadas expressões-código que ficaram gravadas nas escutas das conversas do antigo líder do PS com Santos Silva e outras pessoas. E isso também aconteceu, segundo o MP, quando houve dinheiro encaminhado para Célia Tavares.

Durante a inquirição de 2015 no DCIAP, Célia não foi confrontada com a sequência das intercepções telefónicas de 12 de Maio de 2014 que tinham ajudado a cimentar a convicção dos investigadores de que a testemunha lhes estaria a mentir ao negar a troca combinada com Sócrates e mencionada nos telefonemas posteriores de 14 de Maio. Mas isso também explica que, insatisfeito com as respostas de Célia, Rosário Teixeira tenha demorado pouco tempo a abordar a questão da compra de drogas, tendo começado por se exprimir com alguma dificuldade: "Mas há aqui várias conversas em que essa garrafa, essa expressão ‘garrafa de vinho’ é utilizada e nós também ficamos com a ideia, vale aquilo que vale, não tem hoje outro conteúdo de... nem mesmo significado em termos criminais, mas a de que seria outro tipo de produtos, que seria comprado em conjunto [com Sócrates]."

CT: "Não, de forma alguma, não sei de que é que está a falar."
A contra-resposta do procurador veio de imediato e, desta vez, foi bem mais directo: "Estou a falar em consumo de cocaína." A testemunha voltou a negar – "(…) De maneira nenhuma, de maneira nenhuma." –, mas o inspector Paulo Silva corrigiu ligeiramente as suspeitas apontadas por Rosário Teixeira: "Ou outras substâncias, ninguém está a dizer que seja só cocaína."
CT: "Não tenho conhecimento."
A resposta não fez abrandar a pressão do inspector. "Não tem conhecimento? O problema é que tem, D. Célia. O problema é que tem. Não nos quer ajudar nestes esclarecimentos?", voltou a questionar Paulo Silva.
CT: "Não tenho, não tenho conhecimento, não sei do que é que estão a falar. De maneira nenhuma."

"Então, vamos lá tentar precisar", respondeu-lhe o inspector, que entrou em definitivo nas já referidas escutas de 14 de Maio de 2014. Primeiro, referiu um telefonema de José Sócrates para Célia Tavares, em que o ex-governante perguntou à namorada se era capaz de comprar ao "amigo" as "garrafas de vinho", tendo Célia respondido que estava a estudar na biblioteca para um exame que ainda ia ter nesse dia, mas que faria um telefonema para ver se era possível arranjar as tais "garrafas de vinho".

Pouco tempo depois, num novo contacto, Célia informou Sócrates que não tinha conseguido falar com o amigo, mas que ia continua a insistir. Segundo relatou Paulo Silva na inquirição, Sócrates disse então a Célia para colocar a encomenda num envelope, informando-a que ia mandar alguém para lhe levar outro envelope para fazerem a troca. À medida que o inspector Paulo Silva foi relatando estes e outros pormenores daqueles telefonemas gravados há menos de oito meses, Célia insistiu inúmeras vezes que não se lembrava de nada, mas também disse que era normal que comprasse garrafas de vinho. "Por vezes, ao fim-de-semana, quando jantava com o sr. eng.o, portanto, não jantávamos fora, cá em Lisboa e mesmo fora também não. Comíamos em casa, por ser uma pessoa, uma figura pública obviamente não se pode expor e eu ia ao restaurante ali próximo, fazia as compras take away e levava uma garrafa (...)", justificou.

Rosário Teixeira (RT): "Mas que lhe tenha pedido lá para a faculdade e para falar com uma pessoa amiga (...)?"
CT: "(…) Não sei do que está a falar."
RT: "Pois, a questão é essa, é percebermos o que é que está a falar nessa circunstância."

Célia pareceu concordar por momentos com o grau de estranheza do magistrado: "Na faculdade, garrafas de vinho, na faculdade, não tem muito, não condiz muito, não, penso que não." Paulo Silva soltou apenas um "pois" e Rosário regressou ao diálogo: "Isso era o local onde estava, é mera coincidência, não é preciso valorizar a circunstância. O que é preciso é valorizar essa conversa, e porque é que é pedido que tenha um amigo especial que lhe arranja essas garrafas de vinho."

O inspector tributário acrescentou outra informação seguida de uma questão muito directa: "De tal forma, que a senhora D. Célia até pergunta se aquilo tem que ir bem embalado e ele, o senhor eng.o José Sócrates, diz ‘Basta um envelope com fita-cola’. De tal forma que isto até correu mal porque a tal empregada, quando vai ao seu encontro à faculdade, o sr. eng.o diz que se esqueceu de mandar o envelope dele. Por isso, a D. Rita, empregada doméstica, só foi ao seu encontro para ir buscar algo que fosse a D. Célia a entregar, embalado no envelope, com fita-cola (…) Nesse dia não lhe entregou rigorosamente nada, quem entregou foi a D. Célia a essa empregada. Por isso, é capaz de me dizer o que é que entregou?"

Veja outro vídeo do interrogatório de março de 2017 a José Sócrates:


Mas esta e outras insistências do inspector e do procurador sobre a encomenda não fizeram Célia mudar o que já dissera. Os investigadores só obtiveram parte da resposta seis dias depois, quando ouviram a empregada doméstica Rita Gomes. Os temas abordados na inquirição foram vários (a empregada era suspeita de transportar quadros para a própria casa retirados da residência de Sócrates e ajudara a esconder o computador do antigo primeiro-ministro antes das buscas), mas a combinação telefónica entre Célia e Sócrates surgiu rapidamente nas perguntas do inspector Paulo Silva: "Hum, outra coisa, o sr. eng.o pedia-lhe muitas vezes para fazer recados, para ir fazer as compras e afins, não é? Ah.. e também surgiu aí uma situação, veja lá se se recorda, de ter de ir ali à Cidade Universitária, ir ter com uma pessoa. Recorda-se disso, no ano passado?"

A mulher disse que se lembrava, mas que não sabia a identidade da pessoa com quem se encontrara e que Sócrates só lhe tinha dado referências sobre o local exacto onde teve de se deslocar e o tipo de roupa que nesse dia a interlocutora vestia.

PS: "Certo. E foi levar alguma coisa, a ela?"
Rita Gomes (RG): "Não, não."
PS: "Então, o que é que foi?"
RG: "(...) fui buscar um... um... um envelope. Acho que eram medicamentos."
PS: "Uns medicamentos?"
RG: "Eu acho. Não abri para ver. Eu acho."
PS: "Mas como é que..."
RG: "Deu-me a impressão que..."

Paulo Silva interrompeu-a e perguntou se o envelope em causa estava fechado e Rita disse-lhe que tinha um agrafo, mas que sentiu que o conteúdo fazia um barulho como se fossem "uns medicamentos". O inspector perguntou-lhe se seriam comprimidos, se estavam soltos ou numa embalagem qualquer. A empregada disse que sim e, ajudada pelo inspector, indicou que seria uma espécie de blister, ou seja, os invólucros em forma de lâmina que protegem os comprimidos.

O procurador Rosário Teixeira ainda quis confirmar se fora a única vez em que a empregada doméstica tinha visto Célia e se, naquele dia de 2014, a namorada de Sócrates lhe tinha perguntado se Rita lhe trazia alguma coisa em troca. A testemunha confirmou a primeira questão, negou a segunda e revelou que se limitara a recolher e a entregar a encomenda ao patrão. Mas disse mais: já na casa de Sócrates, garantiu que viu o envelope aberto e que "eram mesmo medicamentos".

PS: "Mas quê? O eng.o estava doente nesse dia? Pediu-lhe para ir buscar?"
RG: "Acho que era por causa da tensão. Devia ser a tensão alta ou é..."
PS: "Hum"
RG: "... qualquer coisa assim, que ele estava com a tensão muito alta."

Lígia Correia
Lígia Correia
Lígia Correia

Os jantares de Sócrates com Célia e Lígia
Logo no início da inquirição de Célia Tavares, a testemunha confirmou que foi uma das namoradas intermitentes de Sócrates (o caso já tinha sido relatado na comunicação social, conforme deixou registado Paulo Silva nos documentos da Operação Marquês). E Rosário Teixeira chegou a perguntar a Célia se a "relação mais íntima" com Sócrates acontecera realmente na sequência da aproximação que a mulher já lhe dissera ter feito, em 2009, ao então primeiro-ministro e candidato a novo mandato à frente do País.

A testemunha confirmou e contou o resto da história: revelou que foi a "curiosidade pessoal e a admiração" por Sócrates que a levou inicialmente a pedir a várias pessoas ligadas à organização de eventos do PS – não citou nomes, mas o MP achava que fora aí que conhecera Lígia Correia – que a levassem a assistir a comícios do partido para ter a oportunidade de conhecer o então primeiro- -ministro. Isso ter-se-á concretizado, tendo Célia dito a Sócrates que era sua "admiradora política e fã". Segundo relatou no depoimento, só mais tarde é que um outro amigo – não disse quem, novamente – é que a contactou para lhe dizer que Sócrates queria conhecê-la melhor.

A relação amorosa surgiu pouco depois. Célia contou que tudo aconteceu depois de o líder do PS ganhar as eleições legislativas de Setembro de 2009 e de ter conquistado apenas uma maioria relativa de votos que lhe permitiu permanecer menos de dois anos no Governo. Mas que o namoro tinha sido um pouco diferente do habitual. "E, portanto, a relação com o eng.o não foi contínua, havia, havia alturas de cinco, seis meses que não nos contactávamos. A relação sempre foi, de certa forma, aberta e madura. Eu não, não havia contactos, não havia telefonemas, porque eu sou assim, é a minha forma de estar nas relações, não pressiono e atendendo ao cargo e à responsabilidade e à dificuldade de tempo, eu não tinha, eu não me sentia no direito de ser uma namorada normal, de estar constantemente a pressionar, nunca fiz com ninguém e muito menos com esta pessoa em questão", garantiu sem revelar qualquer constrangimento.

Em Junho de 2011, quando Pedro Passos Coelho tomou posse como primeiro-ministro e Sócrates foi para Paris estudar, Célia também terá voltado à faculdade, verificando-se então uma nova reaproximação a Sócrates depois de um inesperado telefonema. "’Então como é que estás? Como é que está, como é que estão os estudos?’", contou a mulher no depoimento especificando o que respondeu ao antigo governante: que tinha saudades dele e que lamentava estar em dificuldades económicas e de não ter dinheiro para as propinas universitárias do segundo semestre nocturno do 1.o ano do curso de Direito.

Nos meses seguintes, já em 2012, Sócrates terá passado a pagar-lhe as propinas e muito mais: os livros, as contas de electricidade, o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), uma passagem de ano em Madrid, uma viagem ao sul de Espanha, próximo de Marbella, fins-de-semana no hotel de luxo Pine Cliffs, no Algarve, viagens a França e respectivas estadias no Hotel Lutécia e no apartamento de Paris, um imóvel comprado formalmente por Santos Silva (o custo total, com obras e móveis terá chegado aos 2,8 milhões de euros) e que o MP diz ter sido na realidade de Sócrates.

Tudo isso e uma "ajuda" periódica (o resumo do depoimento de Célia cita entre 300 e 1.000 euros) que vinha directamente das contas de Santos Silva. Aliás, em várias ocasiões foi o empresário que levou pessoalmente os bilhetes de avião para Célia se encontrar com Sócrates. Um procedimento que adoptou também com outra mulher, Sandra dos Santos, que vivia na Suíça e que é apresentada no processo como sendo uma pessoa "do relacionamento pessoal" de Sócrates, do primo José Paulo e do amigo Santos Silva – Sandra deslocou-se várias vezes a Portugal, passou férias com Sócrates em Paris e no Algarve e este dava-lhe dinheiro, tendo-lhe feito chegar, através de Santos Silva, 92.750 euros entre Abril de 2008 e Julho de 2014. O MP acredita que Santos Silva cumpriu sempre ordens do ex-governante, como também ocorreu com o motorista João Perna, que levou envelopes com dinheiro a Célia durante quase dois anos. Isso só parou quando Sócrates foi detido.

Na inquirição no DCIAP, Paulo Silva e Rosário Teixeira optaram por privilegiar apenas alguns destes pagamentos em envelopes e apostaram na questão das "garrafas de vinho" e na relação de Célia Tavares com Sócrates e Lígia Correia. Concretamente, em dois alegados jantares ocorridos no apartamento de Lígia, em Lisboa, em que terão estado estas três pessoas no mês de Outubro de 2014.

A conversa sobre este último tema foi iniciada pelos investigadores de forma bastante calma. Paulo Silva deu o mote – "Conheceu a D. Maria Lígia Correia?" – e mesmo as mentiras ou imprecisões iniciais de Célia não produziram qualquer impacto no procurador Rosário Teixeira.

CT: "Conheci e estive com ela umas duas vezes. E conheci-a, eu penso que a conheci na altura da campanha também, porque ela é política, é uma secretária política. Mas fisicamente, com ela só estive exactamente depois da detenção do eng.o José Sócrates."
RT: "Nunca esteve na casa da D. Lígia?"
CT: "Sim. Nesse mesmo dia, a primeira vez que estive, a primeira vez que a vi, fui ter com ela à casa dela, morava, mora, não sei se ainda mora, próximo das Amoreiras, e fomos jantar juntas. Fomos jantar ao McDonald’s, ao Centro Comercial das Amoreiras. Tive uma única vez."
RT: "... nunca lá tinha ido à casa dela?"
CT: "Não."
PS: "Nem de ter deixado ficar lá uns óculos? Em casa dela? Que alguém depois teve de entregar-lhe?"
CT: "Sim, isso aconteceu, sim."
PS: "Então, esteve na casa dela antes?"
CT: "Sim, sim isso aconteceu, agora que me lembra."
PS: "Pronto, a primeira vez não foi depois da detenção, já foi antes da detenção?"
CT: "Isso foi muito próximo. Foi muito próximo da detenção, se não foi depois. Mas isso foi muito próximo da detenção, ou foi depois, não posso precisar, eu sei que sim, ficaram uns óculos que depois me entregaram os óculos. Não posso precisar."
PS: "Foi quase um mês antes."
CT: "Sim."
PS: "Não é bem próximo! É um mês."
RT: "E não esteve lá também com o sr. eng.o José Sócrates?"
CT: "Não, não, não... julgo que não."

A audição agitada da amiga de Sócrates
Apesar de fortemente pressionada, Célia nunca confirmou que Sócrates tivesse sequer estado nos dois jantares suspeitos e os investigadores chegaram a impacientar-se com as respostas pois acharam que a testemunha estava a mentir de forma deliberada. O inspector Paulo Silva ainda começou por lhe referir o que é que estava em causa no processo-crime – "(...) tudo aquilo que a gente falou até aqui, não valorizo a sua viagem para Paris, valorizo é o gasto da sua viagem para Paris. Está-me a perceber, não é?" – , mas depois chegou a avisá-la: "(...) a postura que está a dar-me, está-me a obrigar a fazer aqui uma situação que detestaria fazer, porque eu exibo-lhe aqui mensagens que contrariam tudo o que a senhora dra. ... o que a D. Célia está a dizer."

Pouco depois, reforçou o tom da ameaça quando voltou a abordar os jantares em casa de Lígia. "Eu não queria ir por aí, D. Célia! Mas está-me a forçar a ir por aí. E nem queria exibir isso para o processo! Eu nem queria estar a exibir isso para o processo, dizer assim, isto agora é um elemento de prova, é pá, para depois isto ficar escarrapachado num processo! E determinado tipo de mensagens que as considero íntimas e que a gente tem que as proteger e não vou estar aqui a dar valor a elas em termos processuais, mas a sra. D. Célia ajuda-nos ao contrário! É pá, para eu não ter que usar isto, explique-me o que é que esse encontro implicou! Não quero saber o que fizeram, deixaram de fazer em termos pessoais, quero saber é: o que é que isso, esse encontro, o que é que levou a que ocorresse determinado tipo de despesas extraordinárias, fora do comum, fora do normal. É só isso que eu quero. O que é que a D. Célia, sobre isso, me pode dizer?"

CT: "Pois, é como lhe digo, não, não, não tenho presente. Não posso dizer-lhe mais nada porque, de facto, mais nada tenho para dizer."
PS: "D. Célia, quer ocultar o evidente, mas pronto."

Os investigadores ainda quiseram saber que tipo de relação tinha afinal Célia com Lígia, quantas vezes se tinham encontrado e se ambas haviam estado com Sócrates num encontro a 16 de Outubro de 2014 e se prolongou até à madrugada seguinte. Novamente, a informação viera sobretudo de escutas telefónicas que faziam supor a existência desse encontro, a pedido de Sócrates, e uma combinação para serem compradas "garrafas de vinhos".

Paulo Silva confirmou isso mesmo e revelou que tinha escutas das conversas de Célia com Sócrates até do momento em que o ex-governante lhe indicou o número da porta e o andar do apartamento de Lígia. Segundo o inspector, Célia teria vindo directamente da faculdade, chegara a casa de Lígia por volta das 22h30 e saíra na madrugada seguinte, às 6h23. A precisão desta última hora indicia que a equipa de investigadores coordenados por Paulo Silva tinha vigiado no terreno a saída do prédio.

O inspector continuou: "(…) o que é que aconteceu nessa noite? Tirando as questões que, como é óbvio, não interessam aqui ao inquérito." Célia deu-lhe a seguinte resposta: "Olhe, (imperceptível gravação do depoimento), certamente, estive a consultar algum livro (…) ou alguns livros." Mas depois hesitou, disse que não tinha a certeza.
PS. "Hum, não se recorda? Beberam vinho então, garrafas de vinho?"

A testemunha Célia vincou de novo que não se lembrava de Sócrates ter estado nesse encontro, mas confirmou que ela própria bebia vinho. O inspector deu-lhe a entender que o gasto em vinho era muito grande (não disse quanto) e especificou que Célia o teria trazido da faculdade, depois de lembrar a Sócrates que não podia esquecer-se de o pagar. Era precisamente esse gasto específico que Silva disse querer apurar em termos de despesas pessoais de Sócrates, tendo até revelado que sabia não de um, mas de dois encontros "sempre com as referências às garrafas de vinho", frisou. Célia manteve a postura e disse que também não se lembrava de Sócrates ter estado nesse segundo encontro, ocorrido cinco dias depois, de 21 para 22 de Outubro de 2014, um mês antes de o ex-primeiro-ministro ter sido detido.

PS: "Não se recorda? Nem de, às 2 da manhã, ligar ao sr. eng.o, no dia 22 de Outubro, a dizer que até estava preocupada com ele, porque ele tinha transpirado muito. Isso também não lhe diz nada?"
CT: "Não, não. Transpirar muito?"
PS: "Pois. D. Célia, começo a entrar por aqui por coisas…"
CT: "Não."
PS: "… que depois, são indelicadas, eventualmente ou não, não sei, não faço ideia, até podem ter feito um jogging [Célia tinha dito na inquirição que corria todos os dias] lá dentro do apartamento e alguém transpirou, não sei. Posso estar a ser indelicado ou não, mas, se quer que eu vá aos pormenores, eu continuo.
CT: "Não, não, não me recordo, francamente…"

O procurador optou por interromper aquele diálogo de surdos e pouco mais aconteceu na sessão além de os investigadores querem saber um ou outro pormenor da relação mantida com Lígia Correia, a militante socialista de 50 anos que nessa tarde também foi ao DCIAP. O depoimento começou às 15h15 e foi ainda mais curto do que o de Célia: durou cerca de 1 hora.

Perante os procuradores Rosário Teixeira e Ana Catalão e os inspectores Paulo Silva e Susana Neves, a nova testemunha começou por reconstituir o percurso profissional a pedido de Rosário Teixeira. Sob o olhar da advogada, Maria Manuel Cavaco, Lígia revelou que tinha sido funcionária do PS e que fora no partido que conhecera, em 1987, José Sócrates. A amizade com o político nasceu também nessa altura e a mulher continuou a caminhada profissional: esteve no secretariado da Alta Autoridade para a Comunicação Social (actual ERC) e depois entrou no ministério socialista das Obras Públicas, entre 2005 e 2011, período em que chegou a exercer as funções de assessora de Imprensa do ministro António Mendonça. Quando o segundo Governo de Sócrates caiu em 2011, Lígia deixou de trabalhar para o Estado e ficou desempregada. E foi com o dinheiro do fundo de desemprego que apostou num negócio: um bar de vinho e tapas, localizado próximo da então casa de José Sócrates, na Rua Braancamp.

O bar acabou por falir e fechou em Janeiro de 2014. "A partir dessa altura (…), é verdade que chegou a pedir algum auxílio, alguns empréstimos, alguma ajuda ao eng.o José Sócrates?", perguntou-lhe o procurador.

Lígia Correia (LC): "Pontualmente, sim, pronto, aliás, eu tenho estado a viver praticamente de empréstimos, não é? As pessoas que me vão ajudando, familiares. Portanto, o que ele me poderá ter ajudado do são coisas de valores irrisórios, portanto."
RT: "O que é que são valores irrisórios?"
LC: "Bem, não tenho assim presente, mas estou a falar de coisas para fazer face ao dia-a-dia, ‘Toma lá cinquenta euros vai comprar o jantar, ou qualquer coisa para jantarmos’, portanto, seria nessa base. Depois, houve ali talvez duas vezes que me tenha empr... não sei, não estou, não tenho presente."

Célia Tavares
Célia Tavares
Célia Tavares


O procurador quis saber quem é que, nessas ocasiões, lhe entregava o dinheiro, Lígia disse-lhe que era Sócrates e Rosário Teixeira avançou para os contactos que Lígia tinha tido com Sandra Santos e Célia Tavares. Por exemplo, o magistrado questionou-a se teria intermediado entregas de dinheiro, contactos e viagens, como indiciavam as escutas telefónicas que o MP tinha na sua posse. A certo momento, a testemunha deu a entender que as perguntas estavam a ir longe de mais e o procurador vincou pela primeira vez que era ele que mandava na sessão: "(…) não tem de perceber o sentido da minha pergunta, tem é de responder às perguntas, mais nada", disse e voltou depois a encaminhar a conversa para a Célia Tavares.

RT: "Esta D. Maria Célia nunca esteve em sua casa? (…) Ainda antes da detenção do eng.o José Sócrates?"
LC: "Não, não, não. Não estou a perceber, são coisas pessoais."
RT: "(..) não tem que sindicar as razões de ser das minhas perguntas. Tem é de responder às perguntas ou não. Portanto, eu estou-lhe a perguntar se essa senhora Maria Célia esteve em sua casa em Outubro, por exemplo, do ano passado [2014]?
LC: "É possível. Outubro, não sei precisar. É possível, sim."

O procurador perguntou-lhe depois se também lá tinha estado Sócrates e se havia sido organizada, "digamos assim, alguma festa, ou alguma entrega de dinheiro". Lígia respondeu-lhe que se limitara a organizar um jantar e Rosário pareceu não acreditar e decidiu avançar por momentos para outros encontros, desta vez de Lígia, Sócrates e Sandra, por exemplo, no hotel de luxo Pine Cliffs, no Algarve. A testemunha voltou a queixar-se que se tratavam de "questões pessoais" e Rosário Teixeira ficou alterado: "São questões que lhe coloco e que a senhora não tem o direito de sindicar (…) Estou-lhe a perguntar, porque tem que ver com os pagamentos que são feitos a esta senhora [Sandra Santos]".

A advogada interrompeu, aconselhou calma à cliente e disse-lhe que respondesse a tudo. Depois, o procurador e o inspector tributário pareceram interessados em perceber o que Lígia tinha a dizer sobre o facto de ter participado também nas compras em massa de livros de José Sócrates (Paulo Silva disse que tinha uma escuta onde a própria Lígia dizia que já tinha adquirido 237 livros em todo o País) e conversas que teria tido com Sócrates quando este lhe ligou de Paris no dia da detenção. Mas sobretudo na compra das "garrafas de vinho" usadas em jantares com Sócrates e nos dois encontros que já tinham levantado celeuma na inquirição de Célia Tavares. Os investigadores começaram por lhe dizer que, sendo Lígia uma antiga proprietária de um bar de vinhos e tapas, seria estranho que precisasse de intermediários/as para lhe comprarem o vinho. Ou que o fizesse directamente num supermercado, como a mulher chegou a dizer,
PS: "Não, a senhora dizia que ia fazer, ia ter que ligar com certas pessoas para ver se arranjavam as garrafas de vinho. Ligava para alguém d’algum supermercado, era?"
LC: "Uma pessoa amiga, sim."

Investigadores não confrontaram Sócrates
O inspector tributário insistiu, quis saber quem era exactamente a pessoa amiga que lhe arranjava o vinho, Lígia evitou dizer-lhe um nome, mas as muitas insistências levaram-na a dizer "chama-se Luís". Paulo Silva voltou à carga: perguntou se o tal de Luís estava ligado a algum supermercado em Lisboa e Lígia disse-lhe que era um "fornecedor" privado, que não sabia se tinha loja em Lisboa. O procurador interrompeu a sequência de perguntas do colega inspector, mas minutos depois Paulo Silva voltou ao assunto com uma subtileza: quis saber se Lígia não tinha confundido o referido Luís com os nomes do filho de Sandra ou do homem que vendia jornais à porta da casa de Sócrates. Afinal, tinham o mesmo nome próprio. Lígia pareceu surpreendida e Paulo Silva aproveitou: "O Luís, falou-me em Luís, estou a tentar identificar esse Luís." A mulher recompôs-se, disse-lhe que não estava a confundir identidades, que o fornecedor andava pelo País a distribuir vinhos e não deu mais pormenores.

PS: "Pronto. E era tradicional vocês [Lígia e Sócrates] beberem numa noite três, quatro garrafas de vinho?
LC: "Sim."
PS: "Era normal? Certo. Nessas vezes que beberam vinho, também houve uma vez em que esteve presente a Célia?
LC: "No jantar em minha casa, sim."
PS: "Sim? E ela trouxe o vinho, dessa vez?"
LC: "Trouxe o vinho, exacto"

José Sócrates
José Sócrates
José Sócrates

A inquirição terminou cerca de 10 minutos depois e a conversa sobre o vinho e o fornecedor ficou por ali. Tal como se verificara com Célia Tavares, as menos de duas páginas do resumo do depoimento de Lígia foram assinadas pela testemunha, investigadores e advogada. Os documentos em papel foram juntos aos volumes principais do processo, juntamente com os dois CD’s com as gravações integrais das declarações. Em nenhum dos resumos foram mencionadas directamente as palavras "cocaína", "drogas" ou as suspeitas que relacionavam vinhos à compra de estupefacientes para consumo de Sócrates e das duas mulheres. Meses depois, já no ano passado e seguindo as instruções do MP, os inspectores Paulo Silva, Judite Neves e Florbela Carvalho transcreveram a totalidade destes testemunhos (e de outros depoimentos), incluindo-os nos volumes das transcrições totais das inquirições da Operação Marquês. Também já foram disponibilizados à defesa de Sócrates.

No entanto, segundo apurámos, o ex-primeiro-ministro (que recusou ouvir ao telefone as perguntas da SÁBADO sobre este caso) nunca foi confrontado com qualquer questão sobre as suspeitas de cocaína durante os três interrogatórios a que foi sujeito (o último dos quais já este ano). Isso também não ocorreu com o amigo Santos Silva ou sequer quando foi detido e interrogado (duas vezes) o motorista João Perna. Ou ainda quando o MP ouviu a 29 de Outubro de 2015 o primo de Sócrates, António Pinto de Sousa, a antiga secretária do ex-líder do PS, Maria João (16 de Janeiro de 2017) e a mãe de Sócrates, cujo testemunho ocorreu a 18 de Abril passado. No processo constam ainda muitas outras dezenas de depoimentos, interrogatórios e milhares de documentos, apensos e anexos com um número quase interminável de escutas telefónicas a que a SÁBADO não conseguiu aceder. Uma parte destas intercepções tem sido mantidas em segredo pelo MP, sob o pretexto de que se trata de questões relacionadas com a vida privada ou política dos visados. Mas várias escutas relacionadas com conversas e jantares políticos de Sócrates foram já juntas ao processo. O argumento do MP? Os jantares terão sido mais uma despesa pessoal de Sócrates paga com o dinheiro que Santos Silva lhe fazia chegar de forma camuflada. Às seis questões sobre as polémicas inquirições de Célia, Lígia e Rita Gomes, enviadas via e-mail ao director do DCIAP, aos procuradores Rosário Teixeira e Ana Catalão e ao inspector Paulo Silva, respondeu a assessoria de imprensa da Procuradoria-Geral da República com um única frase: "Todas as questões de facto consideradas relevantes serão apreciadas em sede de despacho final". Ou seja, quando for conhecida a acusação ou o arquivamento da Operação Marquês, que está prevista para o próximo mês de Outubro. 

Artigo originalmente publicado na edição n.º 697, de 7 de Setembro de 2017. 

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