Fareeda Khalaf, de 20 anos, foi raptada pelo auto-proclamado Estado Islâmico e vendida como escrava sexual em Raqqa. Ao longo de quatro meses de cativeiro, foi violada, agredida e insultada os soldados da facção terrorista, que lhe chamavam "adoradora do diabo" por pertencer à etnia-religiosa yazidi. Em desespero, tentou o suicídio em quatro ocasiões, saturada pela violência e envergonhada por desonrar a família com as violações. Contudo, foi a persistência que prevaleceu e acabou por conseguir escapar das garras do EI. Três anos depois, contada na primeira pessoa, a história da refugiada yazidi arrancou uma ovação de pé à plateia das Conferências do Estoril no Estoril. "Se fosse a vossa mulher, mãe ou filha a ser violada pelo Estado Islâmico. O que fariam?", questionou.
"Muitos estão aqui para contar as suas histórias de sucesso. Mas a história que vou vos vou contar não é de sucesso, mas sim como os meus sonhos, de um dia para o outro, foram destruídos", arrancou a refugiada yazidi.
Antes do trágico verão de 2014, Fareeda levava uma vida pacata em Kocho, zona curda no noroeste do Iraque. Era a melhor da turma a matemática, disciplina que um dia quer ensinar. Segundo o livro que conta a sua história, escrito pela jornalista Andrea C. Hoffmann, "A rapariga que derrotou o Estado Islâmico", Khalaf até conseguira impressionar um professor muçulmano, que olhava com desprezo para a comunidade Yazidi.
Tudo mudou no dia 15 de Agosto de 2014. O grupo jihadista invadiu e cercou Kocho, exigindo a conversão de todos os habitantes. Todos os homens da cidade foram prontamente mortos e as mulheres e crianças, que se recusaram a converter ao islamismo, foram levadas para o mercado de escravos de Raqqa, a auto-proclamada capital do EI na Síria.
"O Estado Islâmico tirou-me tudo. Destruiu a minha vila e matou o meu pai e irmão mais velho. Já a minha mãe foi vendida e tentaram fazer uma lavagem cerebral aos meus irmãos mais novos", disse.
Em Raqqa, Khalaf foi vendida a um soldado líbio, que a escolheu após a examinar "como se fosse gado". Viu-lhe os dentes, as pernas e o rosto. Ao longo de quatro meses de cativeiro, Fareeda foi vendida em várias ocasiões, por soldados que gostavam "da sua insolência", e recomprada por 50 dólares. E continuou a ser abusada sexualmente e constantemente agredida pelos "donos".
No fim de 2014, Fareeda estava em al-Omar, um campo de gás do Estado Islâmico, quando planeou a fuga em conjunto com outras prisioneiras. Numa madrugada chuvosa, caminhou quilómetros de Omar até quase Hasaka, onde foi socorrida e levada para um campo de refugiados de Dohuk onde reencontrou mãe e irmãos mais novos, mas onde também ficou a saber ds mortes de pai e irmão. Além disso, ainda teve de lidar com o estigma com que a comunidade yazidi agora a olhava. "Coitadas! Agora já não conseguem arranjar marido", ouviu a uma senhora de idade, num espisódio recordado no livro de Hoffmann, quando estava com as restantes fugitivas Estado Islâmico, todas vistas como "impuras" pela comunidade.
No Estoril, Fareeda Khalaf explicou como foi "uma das 1100 sortudas que foi levada para a Alemanha", ao abrigo do programa especial de apoio a refugiados promovido pelo governo alemão.
Agora está a salvo, mas ainda não consegue esquecer os abusos físicos e psicológicos que sofreu. "A minha história é trágica, mas ainda há de centenas de yazidis que, neste preciso momento, estão a passar por isto", lembrou a jovem, enquanto chorava perante a plateia. "Quero que vocês imaginem se fosse a vossa mulher, mãe ou filha a ser violada pelo Estado Islâmico. O que fariam?", concretizou.
No fim, após uma ovação em pé do público, Khalaf revelou que a sua cidade natal fora libertada pelo exército iraquiano. A chorar, a refugiada admitiu que viu as fotografias do actual estado de Kocho, hoje em ruínas. "Eu queria ser professora de matemática na minha escola, que agora está em ruínas. É um sonho arruinado", lamentou a yazidi.
Fareeda Khalaf concluiu dizendo: "Gosto de pensar que sou mais forte que o Estado Islâmico, mas sem apoio era impossível".
Esta conferência faz parte da 5.º edição das Conferências do Estoril 2017, onde dezenas de políticos, dirigentes e activistas de todo o mundo questões relacionadas com a migração e a segurança.
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Magda Gama29.05.2017
Magda Gama29.05.2017
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