Ele sabia lutar e acreditava. Foi isso mesmo que Zé Pedro, histórico guitarrista dos Xutos & Pontapés, quis lembrar um dia depois do último concerto da banda no Coliseu dos Recreios, a 4 de Novembro, a que não deixou de ir, mesmo que já visivelmente menorizado pelas dificuldades na luta contra a hepatite C (que já o tinha obrigado a um transplante de fígado, em 2001). O público ovacionou-o, ele respondeu emocionado um dia depois, nas redes sociais, assim mesmo: "EU SEI LUTAR E ACREDITO". A fé não chegou e a batalha foi perdida. José Pedro Amaro dos Santos Reis faleceu esta quinta-feira, 30 de Novembro.

A resistência era inata ao homem nascido a 14 de Setembro de 1956, no Hospital da Estrela, em Lisboa e que se estreou num palco com os Xutos & Pontapés nos Alunos de Apolo, em Lisboa (conta-se que em seis minutos tocaram quatro canções - espécie de manual de iniciação ao punk português). Só com ela seria possível quebrar as barreiras da indústria musical e fazer dos Xutos & Pontapés a maior e mais duradoura banda portuguesa. Afinal, nem tudo foram rosas para o grupo que pôs um País a cantar Contentores, Circo de Feras, Não Sou o Único, Homem do Leme, À Minha Maneira e A Minha Casinha - descobertos pelo radialista António Sérgio (que lhes promoveu o primeiro single, Sémen, e produziu o primeiro disco, 78/82), seriam ostracizados pelas grandes editoras em início de carreira. O segundo álbum chamar-se Cerco veio daí.

As lutas foram grandes mas a década de 1980 ainda viria a definir o estatuto da banda, transformando os Xutos & Pontapés de grupo de culto em banda de estádio. Com a ascensão meteórica - conseguida sobretudo a partir de Circo de Feras, em 1987 - chegariam também os excessos para Zé Pedro. O próprio admiti-los-ia, em entrevista ao Sapo 24, quando questionado sobre como tinha descoberto que tinha hepatite C:

Recentemente, em entrevista ao semanário Expresso, Tim, vocalista da banda, recordava assim o amigo e a sua mudança de vida a partir da descoberta do vírus: "Anos e anos de abusos e uma perspetiva de vida no future estavam a cobrar a conta. Felizmente, safou-se. A partir daí surgiu um Zé Pedro diferente, aquele que as pessoas mais conhecem, sem aditivos nem álcool e cheio de amor pela vida. Infelizmente, porém, a saúde dele foi muito afectada, e a partir dessa altura a banda passou a conviver com a imponderabilidade do estado do Zé. Nós e ele tivemos sempre sorte, conseguimos ir fazendo tudo, mas tem havido momentos de grande tensão, em que a vontade dele de fazer isto ou aquilo choca com a nossa de o proteger. Tem sido muito forte e corajoso, tem sofrido, mas não se tem sacrificado."

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