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O biólogo Noel Miranda criou uma estratégia para ajudar o organismo a reconhecer o tumor. Mas avisa: não haverá nenhum tratamento para todos os casos.
Há principalmente uma, entre outras tantas razões, que explica porque é tão difícil encontrar uma cura contra o cancro. "Nesta doença estamos a contrariar a evolução. O que acontece nas células tumorais é quase como a replicação da evolução das espécies, mas acontece tudo num espaço de tempo muito curto e muitas vezes não conseguimos identificar toda a heterogeneidade do tecido tumoral", explica Noel Miranda. O biólogo de 35 anos, investigador no Centro Médico da Universidade de Leiden, na Holanda, esteve em Lisboa para um encontro sobre Medicina Personalizada em Oncologia na farmacêutica Roche. À SÁBADO falou sobre o futuro do tratamento do cancro através da análise do ADN do tumor.
Fala-se muito de medicina personalizada, e de adaptar os cuidados de saúde ao doente, não à doença. O que quer isto dizer quando se fala de cancro?
A medicina personalizada tem mais a ver com a formação de grupos de pacientes que sabemos que, de acordo com as suas características (por exemplo uma alteração genética), vão beneficiar mais de um tratamento do que de outro.
Não se está então a caminhar no sentido de cada pessoa ter o seu tratamento?
Eu gostava que assim fosse, porque estou a trabalhar numa área específica da imunoterapia em que realmente se utilizam alterações que são específicas de cada doente. Mas há uma coisa que se sabe de antemão: não há nenhuma estratégia que funcione para todos os doentes.
O que quer dizer exactamente olhar para o ADN do tumor?
No nosso hospital, na Holanda, por exemplo, quando um doente é diagnosticado com cancro faz-se uma biopsia e há um painel de genes que são sequenciados para saber se têm alterações ou não. Isso faz-se em Portugal também. Deste ponto de vista já há uma caracterização muito profunda da doença para se fazer a escolha acertada dos tratamentos. Mas tem de haver sempre uma selecção dos casos em que se investiga mais, porque há um custo associado à medicina personalizada.
As biópsias líquidas também ajudam neste sentido?
As biópsias líquidas permitem-nos detectar a evolução ou o aparecimento da doença antes de a conseguirmos visualizar através de um método de imagem. Mas também permitem sinalizar resistências aos tratamentos e adaptá-los.
Já existem tratamentos dirigidos para todos os tipos de cancro?
Não, só para aqueles em que já se sinalizaram alterações genéticas que se podem atacar com determinados tratamentos, como o do pulmão, do cólon ou da mama. Isso tem a ver com as características das células e com os tecidos onde os cancros se desenvolvem e também com o facto de, em alguns tipos de cancro, haver alterações genéticas extremamente reincidentes de doente para doente.
Tem a ver também com o facto de nalguns cancros, como o melanoma (na pele) ou o do pulmão, as células serem muito diferentes?
Sim, as células destes dois tipos de cancro acumulam demasiados erros, derivados da radiação ultravioleta ou do fumo do tabaco, e por isso tornam-se óbvias para o sistema imunitário. O que é importante para o sucesso das imunoterapias: tem de haver uma resposta natural do sistema imunitário. O que o tratamento faz é reforçar essa resposta ou resgatá-la depois de ter sido reprimida.
Os tratamentos convencionais, como a quimioterapia e a radioterapia, poderão progressivamente deixar de ser usados?
A curto e a médio prazo não creio, ainda são os tratamentos que beneficiam a maioria dos pacientes. A imunoterapia beneficia mais pessoas se a soubermos combinar de forma certa com os outros tratamentos.
E a longo prazo?
Se chegarmos a um nível em que conseguimos analisar de forma muito rápida a complexidade dos sistemas celulares e tivermos uma panóplia de soluções para o tratamento, porque não? Mas vai ser muito difícil desenvolver algo que ataque especificamente as células tumorais e não produza efeitos secundários.
Como assim?
Neste momento, a imunoterapia também não é completamente dirigida aos tumores, activa células do sistema imunitário que também podem destruir células saudáveis.
Recentemente houve o caso de uma mulher com cancro da mama metastático que regrediu devido a tratamento experimental de imunoterapia, apelidado como "o mais personalizado possível". Em que consiste?
É parecido com o trabalho que nós estamos a fazer.
Em que consiste esse trabalho?
Uma das formas pelas quais as células do sistema imunitário conseguem reconhecer as tumorais é através de proteínas que são diferentes nos tumores. Estamos a tentar desenvolver uma plataforma em que se usem essas proteínas para fazer vacinas que estimulem o sistema imunitário a reconhecer as células tumorais. Ou seja, como se vacina por exemplo contra a gripe, para preparar uma resposta imunitária quando encontramos o patogénico, neste caso vacinamos os doentes para estimular uma resposta imunitária para reconhecer as células tumorais e eliminá-las. É um tratamento específico para cada doente.
Como testam essas proteínas para reconhecer o tumor?
Testamos em laboratório se as células T [células do sistema imunitário] que isolamos do paciente conseguem reconhecer as proteínas que estão alteradas nos tumores. Depois, utilizamos essas proteínas que conseguem provocar resposta imunitária para constituir a vacina.
Qual é a principal dificuldade?
É trabalho para dois meses, o que poderia ser implementado no caso específico de cancro do cólon em que há uma sobrevida suficiente depois da cirurgia para o doente beneficiar desse tratamento.
Porquê o cancro do cólon?
É um cancro interessante do ponto de vista imunitário. Há dois grandes grupos de pacientes: um tem daqueles cancros muito óbvios para o sistema imunitário; o outro não. É nesse, que constitui a maioria (mais de 80%), que estamos interessados.
Tratamentos como esse, completamente dirigidos, podem mesmo assim não ser suficientes?
Acho difícil que vá haver uma silver bullet mas é difícil antecipar o que vai acontecer. Se há uns anos me dissessem que haveria uma imunoterapia que produziria respostas tão dramáticas em pacientes com melanoma ou cancro do pulmão eu não acreditaria.
Artigo originalmente publicado na edição n.º 737 de 14 de Junho de 2018.
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