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O que o Natal tem de anómalo é que, para além do consumismo e do kitsch dos Pais Natal, ainda conserva alguma coisa de um momento afável, de privacidade, de encontro familiar, embora as famílias transportem com elas vários abismos entre as pessoas e às vezes eles estraguem a quadra
Na verdade, nada. O Natal é uma anomalia nos nossos costumes sociais. Ou melhor, devia ser. O que o Natal tem de anómalo é que, para além do consumismo e do kitsch dos Pais Natal, ainda conserva alguma coisa de um momento afável, de privacidade, de encontro familiar, embora as famílias transportem com elas vários abismos entre as pessoas e às vezes eles estraguem a quadra. Mas sempre há um esforço, as crianças gostam das prendas, os adultos da comida, algumas pessoas gostam de outras pessoas, outras detestam -se mas calam-se por um dia, e, quando há algum dinheiro, os dias das festas podem ser amáveis pelo menos para alguns.
Na maneira como isto está, não é mau.
Ameaças ao Natal
Passamos o ano distraídos a olhar para ecrãs e suspeito que o mesmo acontece nestes dias de "Festa da Família". O telemóvel manda na sociabilidade das pessoas nos dias de hoje e não pára no Natal.
Viver numa península
É como se fosse uma Península, com um estreitíssimo istmo, unindo várias ilhas e continentes e mares vastos. Explico-me. Escrevo diante de um ecrã de computador, e à minha direita está o istmo que me permite chegar aqui. Na margem esquerda ergue-se uma montanha de livros por ler e uma pilha de correspondência por ler e por arquivar. Depois há uma alta colina com as "últimas entradas", ou seja grupos de papéis, que ou estão por digitalizar, ou por inventariar. O primeiro é do Sindicato dos Técnicos de Handling de Aeroportos, e depois vários programas do Cine Clube de Torres Vedras e por aí adiante. Entre mim e o ecrã está a última digitalização, uma revista inglesa chamada Counterpoint, depois uma lupa, dois comandos, um carimbo do Ephemera, um lápis do #ribatejosabeamar, outro da UGT de Viana do Castelo.
Depois há um vale, e uma cordilheira com vinte e três montanhas, a que vulgarmente se chamam caixas. Uma tem em cima um magneto que diz "Books Not Bombs", e um autocolante da Gazeta da Semana, uma fita do PNR, e um baralho de cartas do PS que diz "Avançar Portugal". Outra, um boletim chamado Sinais dos Tempos do Centro de Divulgação da Doutrina Social da Igreja – Vigararia da Amadora, e por baixo um número antigo de Mãos de Fadas, com um bordado com o escudo de Almada na capa, razão porque veio junto com uma colecção monográfica sobre Almada. No cume mais pequeno, protegido por uma mica, está um comunicado em stencil da Lista B da Oposição de Coimbra, assinado por António Arnault, António Campos, Henrique de Barros, Orlando de Carvalho, e Rui Clímaco, dirigido aos "Agricultores".
Os doutores de Coimbra e Lisboa, gente corajosa para fazer parte de uma lista daquelas naquele tempo negro, começam assim: "Trabalhadores de sol a sol, vós sois a maioria, a grande maioria dos desamparados pelos actuais senhores do Governo". "Governo" com maiúscula, que o respeitinho em Coimbra é outra coisa. Por baixo, um número antigo do Público. Deve ter um artigo qualquer que quero guardar. Por detrás, uma cordilheira ainda maior mas mais parecida com os montes antigos do Barroso do que a anterior, mais próxima do Gerês nos seus píncaros. Nessa serra, alta mas de cabeços arredondados, estende-se a secção "Por ver", fonte de grandes alegrias, porque às vezes revela coisas que foram ali colocadas e de que já não me lembrava, ou não tive tempo para ver quando as guardei. Ao lado, fechando a outra margem do istmo estão envelopes, folhas em branco e as tenebrosa micas, fonte de derrocadas porque escorregam suavemente e a gente a ver o monte a vir atrás. É o armazém das arrumações, a fábrica das distinções entre o papel A e o papel B, que representa o progresso do "Por ver" para o "arrumar" no sítio definitivo.
Ao lado, fechando a margem do istmo está uma pilha de livros que precisam de um olhar mais atento antes de irem para as estantes. Os primeiros incluem Pó, Cinzas e Recordações de Rentes de Carvalho, o estudo de Joseph Conefrey sobre periódicos portugueses entre 1826 e 1834, um folheto de uma editora alternativa chamada "Douda correria", de Joana Manuel, e Spontaneous Particulars. The Telepathy of Archives de Susan Howe, etc., etc., etc., etc., etc. e os etc. não cabiam na SÁBADO toda. Como se está bem aqui.
O vil Trump exerce a sua vileza no Natal
Em bom rigor, não seria de se esperar outra coisa. Trump, na sua megalomania, acha que restaurou a expressão "Feliz Natal" que o muçulmano Obama e a "crooked" Hillary pelos vistos proibiam para usarem uma expressão supra-religiosa qualquer. Ele, Trump, "libertou" o Natal das masmorras do "politicamente correcto". E, para celebrar o Natal, insultou um agente senior do FBI, cuja mulher cometeu o crime de ser uma candidata democrática (se fosse republicana não era certamente problema) e sugeriu que não tivesse a pensão a que tem direito. Vil. Acresce que o dito agente é uma testemunha directa que pode validar as declarações do director do FBI, que ele demitiu, sobre uma conversação entre ambos em que Trump lhe pediu a "lealdade" e que não "perseguisse" o caído em desgraça Conselheiro Nacional de Segurança. SAD!
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